O termo Energia Geotérmica é muito amplo e descreve praticamente todos os sistemas de energia associados ao emprego da “energia natural” contida no subsolo terrestre e nos corpos aquáticos (mares, lagos, rios etc.).

Considerando as aplicações específicas dos sistemas de ar condicionado e/ou refrigeração, excluímos uma série de soluções que usam a energia do subsolo, tais como aquelas empregadas para geração de energia elétrica ou térmica de alta temperatura.

Como nosso país está localizado longe das grandes falhas geológicas (normalmente situadas nos encontros das placas tectônicas), não temos em nosso território fontes de calor de temperaturas mais altas, características desses locais. Isso não quer dizer que nosso território não tenha falhas geológicas, pois um estudo de 2002 identificou 48 falhas, que eventualmente provocam pequenos tremores.

A Figura 1 mostra as placas tectônicas no mundo e, na América Latina, somente a costa do Pacífico tem uma grande falha geológica.

Figura 1

Um caso bem característico da ocorrência de grande energia geotérmica em áreas de falhas geológicas é a Islândia, uma ilha vulcânica localizada no norte do Atlântico, situada sobre a falha divisória das placas norte-americana e da eurásia (ver Figura 2). Não por acaso, uma das maiores aplicações geotérmicas do mundo é a cidade islandesa de Reykjavik, município com cerca de 200 mil habitantes, que utiliza água quente natural para fornecer aquecimento à prédios e residências desde 1930. A termoelétrica geotérmica Hedlisheydi, que aparece na foto de abertura deste artigo, está a 25 quilômetros de Reykjavik e produz 330 MW.

Geotermia no ar condicionado

O termo bomba de calor geotérmica GSHP (Ground Source Heat Pump) é aplicado a uma variedade de sistemas que usam o solo, a água subterrânea ou corpos de água como fonte ou rejeição de calor. Outros termos como GCHP (Ground Coupled Heat Pump), GWHP (Ground Water Heat Pump) e SWHP e (Surface Water Heat Pump) são variantes do termo geral GSHP.

Infelizmente, as condições do subsolo em nosso país são pouco conhecidas, com pouca ou nenhuma informação sobre o solo, no que se refere aos itens importantes dos sistemas GSHP, que necessitam:

– A temperatura média x profundidade;

– A composição do solo;

– A condutividade térmica;

– O teor de água e profundidade do lençol freático;

– Existência de rochas.

As informações acima são fundamentais para a avaliação técnica e financeira do projeto, sendo que algumas delas podem ser impeditivas tal como a existência de rochas, o que aumenta em muito os custos de escavação e/ou perfuração.

As principais razões pela decisão de realizar um projeto com GSHP basicamente são:

– Embora inexistentes no nosso país, estão em uso no mundo desde a década de 1940;

– Usam a temperatura constante do solo como fonte de calor ou dreno de rejeição de calor, empregando desta forma muito menos energia;

– Podem tanto servir para resfriar (rejeitando calor para o solo) quanto para aquecer os ambientes – retirando calor do solo (ver Figura 3);

Figura 3

– Podem gerar água quente doméstica por meio de desuperaquecedores na descarga dos compressores;

– Praticamente não sofrem com variação das estações, operando praticamente com a mesma eficiência ao longo do ano;

– Embora sejam usualmente mais caras do que outras formas de refrigeração / aquecimento, têm bom índice de retorno no investimento;

– São simples e confiáveis na operação;

– São silenciosas e não requerem espaço útil externo, sem o emprego de torres de resfriamento de água ou condensadores externos;

– Tem consumo de água nulo;

Aproximadamente 60.000+ (base 2006) bombas de calor geotérmicas são instaladas nos USA por ano (segundo o DOE), representando 245.000 TR/ano (ver Figura 4), com um total acumulado de mais de 1.000.000 de unidades.

Figura 4

Alguns estudos mostraram que a temperatura média do solo brasileiro gira ao redor de 19ºC a 20ºC, e a Figura 5 mostra um comparativo de energia consumida em um sistema com condensação a ar e um geotérmico. Nesta figura a comparação também refere-se, a título ilustrativo, ao consumo de energia para uma bomba d’água operando contra uma diferença de cota dZ, enquanto os sistemas de refrigeração por compressão trabalham contra um diferencial de temperatura dT, simplificadamente representado pela diferença entre o meio de rejeição de calor (ar ou solo) e a temperatura de evaporação do refrigerante de 1ºC.

Figura 5

A pergunta que fica no ar: se estes sistemas são tão interessantes e econômicos porque não andam no nosso país? As razões são várias, mas prefiro ressaltar duas:

1)A falta de interesse de nosso governo na eficiência energética, pois gastar dinheiro público em novos sistemas de geração centralizada dá muito mais resultado (poder e dinheiro) para os nossos políticos e administradores públicos do que a eficiência energética, que é descentralizada;

2)A cultura da inflação, ainda vigente, não incentiva investimentos de médio à longo prazo.

Embora as soluções GSHP sejam muito diversas, com vários tipos de sistemas, indicaremos abaixo apenas algumas das mais aplicadas:

Loop hidráulico horizontal

A instalação com loop hidráulico fechado horizontal é geralmente mais apropriada do ponto de vista de custo para instalações de pequeno e médio porte, e particularmente para construções onde áreas externas são disponíveis. Requer valas de pelo menos 1,2 m de profundidade (preferivelmente de 3 a 4 metros).

Os sistemas mais comuns usam dois tubos de PEAD enrolados conforme mostra a Figura 6, e a serpentina formada é chamada de “Slinky™ Coil”, que pode ser instalada verticalmente ou horizontalmente no terreno.

Figura 6

Loop hidráulico fechado vertical

Edificações de médio e grande porte em geral usam sistemas verticais, onde a área de terreno é insuficiente para sistemas horizontais (ver Figura 7). Para sistemas verticais, poços (aproximadamente de 10 a 15 cm de diâmetro) são perfurados com um espaçamento de 2 a 6 metros e com 30 a 150 metros de profundidade. Nestes poços são colocados dois ou quatro tubos que são conectados no fundo com uma curva em U de modo a formar um loop vertical (Figura 8).

Figura 7

Os loops verticais são conectados com coletores horizontais (em valas), que por sua vez são conectados ao sistema do prédio. Este tipo de sistema emprega diretamente a água do subsolo, do mar ou de um lago como o fluido de troca de calor, que é circulada pelo sistema de refrigeração. Uma vez utilizada pelo sistema, a água é devolvida ao solo por outro poço ou descarregada diretamente na superfície do corpo d’água. Esta opção só é possível de ser empregada onde há suficiente água relativamente limpa e de boa qualidade (quanto à corrosão e incrustação) no subsolo.

Figura 8

Loop hidráulico vertical aberto

Para os sistemas verticais um dos pontos de maior custo é a perfuração dos poços, que foi muito desenvolvida em termos industriais específicos para os sistemas GSHP nos Estados Unidos e em outros países que conseguiram otimizar a produção desses sistemas.

No Brasil, os custos de perfuração ainda permanecem altos, dificultando a viabilidade econômica desta solução. Ressaltamos a importância na fase de projetos da influência da saturação térmica do terreno, que pode sofrer gradativo aumento de temperatura (no caso de rejeição de calor para o solo) ou gradativa redução de temperatura (remoção de calor).

Precauções  

Embora estimativas simplificadas de sistemas (principalmente em relação às áreas de troca de calor no solo) existam, elas foram empregadas no passado, no início das aplicações, e alguns casos usando esta técnica acabaram com problemas. Aconselha-se um detalhado cálculo dos requerimentos de acordo com as técnicas mais atualizadas.

É também recomendada a análise e simulação do ciclo anual de operação do sistema, que pode ser “renovado termicamente” pela inversão da operação verão/inverno, caso exista.

Outras soluções possíveis para a redução da carga térmica no solo são os sistemas híbridos, nos quais, por exemplo, a rejeição de calor pode ser parcialmente feita por um sistema complementar, tal como um resfriador evaporativo em circuito fechado, em série ou em paralelo, com o trocador com o solo.

Os sistemas híbridos também são apropriados para nivelar (peak-shaving) a rejeição de calor em condições de carga extrema, resultando em menor investimento e melhor retorno financeiro.

Nossa experiência nestes sistemas foi nos seguintes projetos:

1)Hotel Westin Lagunamar (Cancun, México, 2008), de 1600 TR – Sistema vertical de loop aberto somente para resfriamento – que emprega um loop aberto com água do subsolo. Por razões de proteção contra corrosão, o sistema de água do subsolo tem sua operação limitada aos dois poços (tomada e descarga de água no terreno, ambos a 40 metros de profundidade), bombas especiais, tubulações diâmetro 12 polegadas em PVC industrial, e aos trocadores de calor de placas em titânio. A água do subsolo (ao redor de 19ºC) resfria a água de condensação que opera em circuito fechado.

2)Minha casa, construída em Teresópolis (RJ), em 2001 (com sistema horizontal de loop fechado – Slinky Coil, com um chiller a água de 15  TR com 2 compressores scroll de 7,5 TR cada). Este chiller possui um desuperaquecedor (para produção de água quente sanitária a 50°C), operação em ciclo de resfriamento ou de aquecimento, reversão de operação (verão / inverno) por meio de troca hidráulica do circuito de água gelada e de condensação.

Este sistema opera com elevada eficiência tanto para resfriamento quanto para aquecimento, sendo o aquecimento ambiental feito por piso radiante, com total ausência de ruído, e consumo de água nulo.

Edison Tito Guimarães é diretor da Datum Consultoria e Projetos e membro do DNPC da Abrava.

O conteúdo da seção Projeto & consultoria é gerado pelo DNPC (Departamento Nacional de Empresas Projetistas e Consultores) da Abrava.

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