Numa definição esquemática pode-se considerar que os sistemas VRF estão destinados às instalações residenciais de alto padrão e comerciais de porte médio e, aos sistemas de água gelada, grandes instalações com carga térmica elevada; mas isso não é suficiente para dar conta da complexidade de fatores de escolha

O debate entre água gelada versus VRF já perdeu um pouco o brilho. Atualmente o mais sensato é delimitar o espaço de cada um dos sistemas. Entretanto, ainda há quem embaralha um pouco os conceitos e acaba por meter os pés pelas mãos. Por outro lado, se há algum tempo percebia-se o VRF crescendo sobre os chillers, hoje talvez o mais correto seja dizer que ele cresce no espaço reservado à expansão direta. A questão é saber qual o espaço de cada um dos sistemas.

“Dependerá muito da estrutura do projeto, das condições de controle e do espaço disponibilizado. Ambos os sistemas contam com equipamentos de alta eficiência energética e a qualidade do ar interno poderá ser atendida nos dois casos”, entende Gustavo Hoffmann, da Engenharia de Aplicação da Midea Carrier.

“Em geral os sistemas VRV têm sido amplamente utilizados em aplicações de condicionamento de ar em ambientes residenciais de alto padrão, aplicações comerciais e corporativas e edificações de porte médio e com menor restrição quanto ao controle de umidade e, hoje, também já atendem edifícios corporativos de grande porte e aplicações em clínicas, hospitais e no segmento hoteleiro.

“Já os sistemas de água gelada e água quente têm aplicação bem flexível tanto quanto ao tipo e tamanho das cargas e quanto aos regimes de operação , tendo sido aplicados em todo tipo de edificação com sistemas convencionais  de ar-condicionado  sem controle de umidade muito preciso, como supermercados, ambientes corporativos, shopping centers, aeroportos, igrejas e processos industriais, chegando a aplicações especiais que necessitam controle bem preciso de temperatura e umidade, como datacenters, salas de cirurgia e ambientes hospitalares especiais, museus, salas limpas e cabines de pintura na indústria, dentre tantas outras aplicações”, continua Luciano de Almeida Marcato, Gerente Nacional de Vendas da Daikin.”

Entendimento semelhante tem André Peixoto, Senior Portfolio Manager Latin America da Trane, explicando que a evolução tecnológica nos sistemas de ar-condicionado, tanto VRF como sistemas de água gelada, podem ser utilizados em uma ampla variedade de aplicações. Do ponto de vista energético, ele destaca a grande evolução que os sistemas VRF apresentaram nos últimos anos. “Atualmente, por exemplo, existem muitos edifícios que atingem os níveis mais altos de certificação LEED onde as altas eficiências são essenciais e os sistemas VRF já se fazem presentes em importantes prédios certificados.”

“Em geral, grandes sistemas com uma carga térmica de base elevada podem contar com chillers de altíssima eficiência energética, assim como novas tecnologias permitem que muitos sistemas de água gelada tenham excepcional performance em cargas parciais. Já no que diz respeito à qualidade do ar interior, apesar de tradicionalmente se utilizar sistemas de água gelada para aplicações com filtragens especiais ou 100% de ar externo, atualmente os modernos sistemas VRF também já permitem utilização de tipos similares de unidades interiores”, completa Peixoto.

A avaliação de qual sistema a ser aplicado para um determinado projeto, deve considerar uma série de fatores, explica Allan Denis Bischoff, Gerente de Aplicação e pós-vendas CAC da Gree. “Em geral sistemas de expansão indireta têm uma performance melhor em relação a eficiência energética, quando falamos de projetos com alta capacidade como, por exemplo, projetos acima de 1000 ton. Já os equipamentos VRF atendem melhor projetos de menor capacidade, pois trabalham melhor em cargas parciais, pois, além de serem inverter, são unidades modulares, acionando as unidades conforme a demanda necessária. Com relação a qualidade do ar interno, ambos sistemas possuem a possibilidade de instalar AHUs que podem ser fabricadas com sistemas de filtragem eficientes e admitindo uma porcentagem de ar exterior que garanta a quantidade de trocas necessária para a boa qualidade do ar interior.”

Eficiência energética

Tampouco em relação ao desempenho energético de cada um dos sistemas, os especialistas não divergem muito. “Os sistemas VRF trabalham com o conceito inverter em compressores, ventiladores e com um sistema de controle bastante desenvolvido. Por outro lado, hoje existem opções de equipamentos de Água Gelada (AG) 100% Inverter, fabricados no Brasil, que apresentam excelente nível de consumo de energia”, diz Hoffmann.

Marcato, é enfático em argumentar que a eficiência não depende somente do tipo de equipamento especificado, mas, também, das características de cada projeto e das condições e qualidade dos componentes com os quais foi instalado e se mantém em operação.

“Em geral, para ambos os sistemas é possível obter altos níveis de eficiência energética e os sistemas VRV têm melhor relação custo-benefício quando aplicados em edificações de porte pequeno e médio, para uso primariamente de conforto e com grande diversidade e variação de carga. Já os sistemas de água gelada são mais indicados para grandes instalações ou aquelas cujo controle da carga latente seja mais significativo e importante, com limites mais rígidos de temperatura e umidade”, diz Marcato.

Ele explica, ainda, que devido à flexibilidade na customização do selecionamento de serpentinas de água gelada, com ampla gama de tipos e tamanhos das serpentinas, esses ajustes finos são mais fáceis de serem atingidos com serpentinas de Climatizadores de expansão indireta, que, no caso dos sistemas VRV, reduzem-se às unidades internas com serpentinas padronizadas. Outra vantagem dos sistemas VRV, diz ele, é possuir para o lado ar amplo uso de ventiladores do tipo vazão variável com motores de corrente contínua e acoplamento direto, aplicados em redes de duto menores ou mesmo sistemas não dutados, tipo cassete ou Hi Wall. “Estes sistemas de distribuição de ar são, em geral, mais eficientes que os sistemas convencionais de vazão constante de ar, muito utilizados tanto em self contained quanto rooftops, splitões e sistemas de água gelada no Brasil.”

“Em sua grande maioria são aplicados motores de corrente alternada com transmissão polia correia de menor eficiência global (mecânica e elétrica) se comparados com conjuntos moto ventiladores de acoplamento direto e motores DC. Porém, mais e mais temos visto o aumento da demanda por este tipo de solução nas unidades de tratamento de ar e fancoils para climatização, com notório crescimento nas indústrias farmacêuticas, segmento hospitalar e datacenters, visando menores custos de operação e manutenção mais simples e barata a longo prazo. A recomendação é que sempre que possível seja feita a simulação de carga térmica e consumo hora a hora em software de simulação (Energy Plus, por exemplo) de forma a obter, com base nos níveis de eficiência de cada tipo de sistema ou projeto, a melhor comparação dos custos de implantação versus consumo anual esperado”, completa o gerente da Daikin.

“Definitivamente não se pode estabelecer que um sistema VRF ou um sistema de água gelada sempre vai ser mais eficiente que o outro. Características de diferentes perfis de carga térmica e operação, bem como a grande variedade de tecnologias atualmente disponíveis que podem ser utilizadas em diferentes projetos, podem fazer que ora sistemas VRF ou sistemas de água gelada tenham operação mais eficiente, dependendo da aplicação dos produtos que podem ser utilizados”, alerta Peixoto.

Automação embarcada: vantagem ou não?

Esta é uma questão que também merece ponderação. “Quando consideramos a facilidade de instalação, é uma vantagem, pois, não exige uma empresa especializada em automação para desenvolver o controle e garantir que o equipamento irá rodar sempre conforme indicação do próprio fabricante. Em contrapartida, um sistema de água gelada dá mais liberdade para que o projetista e o instalador atendam exatamente a uma condição de operação específica. Vale reforçar que em água gelada sempre é recomendado que o sistema de controle seja feito por empresas especializadas”, pontua Hoffmann.

Mais enfático, Marcato entende que a automação embarcada é uma das grandes vantagens dos sistemas VRF, uma vez que em sua concepção os fabricantes aplicam todo seu conhecimento para que os equipamentos tenham capacidade de se comunicar de forma rápida e confiável e, com sua correta operação, buscar melhorar seu desempenho térmico e energético. “Com base em diversos sensores de temperatura e pressão instalados em todo o sistema, os controladores verificam o melhor ajuste dos compressores e ventiladores e sistemas de expansão para garantir atendimento da temperatura desejada com menor consumo. É notório que os projetistas têm menor possibilidade de intervir nos loops de controle e operação dos VRV, e devem se preocupar mais nos aspectos de dimensionamento das cargas térmicas sensíveis e latentes, vazão de ar insuflado e renovação de ar, filtragem e distribuição homogênea das vazões de ar, e aspectos de simultaneidade e correto dimensionamento da diversidade de aplicação das unidades internas.”

Peixoto, da Trane, prefere a moderação. “Existem vantagens e desvantagens no fato de sistemas VRF já possuírem automação embarcada. Pode-se destacar as vantagens de menor custo inicial e maior facilidade de implementação de sistemas de automação com a tecnologia VRF. Porém, da parte de sistemas de água gelada, os sistemas de controles podem ser muito mais sofisticados e personalizados de acordo com as necessidades de cada projeto. Assim como para sistemas de água gelada, excelentes empresas de projeto podem sofisticar sistemas de automação para sistemas VRF através de utilização de gateways para sistemas de supervisão predial.”

“O sistema VRF realmente possui uma série de automações embarcadas que proporcionam ao responsável da obra a possibilidade de realizar uma configuração que atinja o melhor rendimento possível. Principalmente em relação a configuração da forma de operação do sistema, como programações horárias, operações noturnas com variações suaves, modos de economia etc. Para o projetista, sistemas de água gelada têm uma flexibilidade maior no momento do desenvolvimento do projeto, para trabalhar a melhor performance do sistema, pois pode trabalhar nos equipamentos de ventilação, hidráulica e condensação quando aplicável”, completa Bischoff.

Por outro lado, os sistemas de água gelada são mais suscetíveis à intervenções no projeto, o que pode elevar significativamente seu desempenho. “Em condições específicas de controle, com temperatura e, principalmente, umidade controlada, os sistemas de água gelada tendem a ser mais precisos e, portanto, mais eficientes na operação. Projetos de grande capacidade são propícios para sistemas de água gelada, pois os equipamentos centralizados podem entregar uma alta eficiência quando bem controlados”, defende Hoffmann, da Carrier.

Luciano Marcato complementa: “Desde que corretamente dimensionados e selecionados, sempre será possível projetar um sistema de expansão indireta que tenho melhor rendimento que um sistema VRV, por exemplo, cargas constantes com altas temperaturas de condensação devido à localidade. Devem ser considerados critérios de localização geográfica, tipo de aplicação, qualidade de água e energia etc.”

Sistemas VRF com condensação a água

É necessário observar que um projeto com sistemas VRF não necessariamente precisa se ater à distribuição do ar através das unidades internas, mas também através de dutos. Assim como não necessariamente precisa estar restrito à condensação a ar, sendo possível configurá-lo com condensação a água.

Gustavo Hoffmann, explica que os ganhos de eficiência inerentes à troca de calor com água, assim como as eficiências dos equipamentos, são maiores quando comparados com equipamentos com condensação a ar. “Entretanto, é importante entender que sistemas de condensação a água terão um acréscimo de consumo de energia das bombas de água de condensação e torre. Ainda, projetos com condensação a água possuem comprimentos de linha menores, o que diminui a perda de carga do sistema e melhora a eficiência. Sempre se faz necessário entender o caso e a viabilidade de melhoria no que diz respeito a consumo energético.”

“Por trabalhar com menor temperatura no pico de carga, os VRV com condensação a água têm menor pressão do lado da condensação e isso melhora o rendimento das unidades condensadoras, porém, é acrescido o consumo extra das bombas de água de condensação e das torres de resfriamento. Para condição de pico de carga e temperatura externa, os sistemas com condensação a água apresentam maior eficiência global e menor consumo de energia”, entende Marcato.

Didático, o Gerente Senior da Trane, explica que os sistemas VRF com condensação a água utilizam unidades interiores e sistemas de controle e automação iguais aos de condensação a ar. “Em geral, unidades condensadoras VRF com condensação a água e chillers condensados a água possuem melhor eficiência energética, porém, é necessário também considerar o uso de energia de equipamentos auxiliares como bombas de água de condensação e torres de resfriamento. Além disso, o custo da água, o custo de tratamento da água e o custo de manutenção devem ser considerados para análise técnica e econômica para utilização de sistemas com condensação a água. Empresas de projeto possuem a expertise para definição do tipo de tecnologia adequado para as mais diferentes aplicações.”

“A aplicação de unidades VRF com condensação a água tem como objetivo atingir projetos específicos, nos quais não é possível aplicar unidades com condensação a ar, por falta de área técnica disponível ou com espaços insuficientes. A relação de eficiência da unidade VRF com condensação a ar e condensação a água é praticamente a mesma, tendo um consumo de energia extra das bombas de água e da torre de resfriamento fechada. Um grande exemplo de aplicação deste tipo de unidade são edifícios comerciais de fachada completamente envidraçada e com uma quantidade de andares superior ao desnível máximo de equipamentos VRF. Neste caso, utiliza-se unidades VRF de condensação a água posicionadas em andares intermediários do edifício, atendendo aos pavimentos acima e abaixo do local onde as unidades estão instaladas”, explica o Gerente de Aplicação e pós-Venda CAC da Gree.

Marcato explica quais os equipamentos indicados para realizar a condensação, no caso de sistemas a água. “Para sistemas VRV equipados com condensadores do tipo placa, é recomendado uso de torres do tipo evaporativo de circuito fechado ou torres de resfriamento convencionais com trocadores de calor intermediários para evitar incrustação e perda de rendimento e capacidade das unidades VRV. Existem projetos de condensadoras com trocadores tube & tube, porém, em caso de sujeira nos trocadores, sua manutenção torna-se mais complexa e difícil, o que acaba afetando a eficiência e performance térmica do sistema como um todo.”

Os dois sistemas diante dos objetivos da Emenda Kigali

“Hoje os sistemas de água gelada já estão disponíveis com nova família de fluidos refrigerantes com níveis de potencial de aquecimento global (GWP) menores que os HFCs R134a e R410a, alinhados com as premissas da Emenda de Kigali, embora as consultas e vendas em 2021 tenham sido pequenas se comparadas com o volume total comercializado no mercado brasileiro, seja de equipamentos com produção nacional ou mesmo importados. A grande maioria dos sistemas VRV e de água gelada no Brasil ainda é com uso de HFCs”, explica Marcato.

“A emenda Kigali busca a eliminação dos HFCs e, nesse sentido, tanto o R-410a, largamente usado nos sistemas VRF, quanto o R-134ª, usado em chillers, devem ser trocados por refrigerantes com menor GWP. Nesse sentido, vemos que os chillers estão na frente com o R1234yz. As mudanças necessárias em projetos de chillers são mínimas em comparação com o VRF e não demandam qualquer adaptação ou conhecimento prévio na sua instalação; já no VRF existe a demanda de completa reformulação tanto no equipamento quanto no treinamento do mercado para o seu uso. Hoje, o grande candidato para a substituição do R-410A é o R-32, entretanto, para sistemas maiores o mercado sequer tem equipamentos desenvolvidos”, conclui Bischoff.

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