Sistemas de controle de fumaça são cada vez mais frequentes no cenário dos novos empreendimentos que estão sendo implantados, principalmente no estado de São Paulo, em edificações de grande porte e amplo acesso de público. Não se trata de algo inovador quanto ao seu conceito, pois, refere-se a um assunto amplamente estudado e evoluído nos países desenvolvidos, com inúmeras normas e literaturas já publicadas, mas ainda em fase embrionária de aplicação aqui em nosso país.

Todos se recordam da tragédia provocada pelo incêndio na Boate Kiss, ocorrido em janeiro de 2013 em Santa Maria (RS), que resultou em centenas de mortos e feridos, sendo que a grande maioria das fatalidades ocorreu em consequência da inalação de gases tóxicos resultantes da combustão dos materiais existentes no local. Dentre outros diversos aspectos de segurança contra incêndio que foram negligenciados, a boate não dispunha de uma instalação de controle de fumaça que, se estivesse disponível, poderia ter contribuído para salvar inúmeras vidas.

No estado de São Paulo desde agosto de 2001, com a publicação do Decreto Estadual nº 46076, acompanhado das Instruções Técnicas do Corpo de Bombeiros, as instalações de controle de fumaça tornaram-se obrigatórias para diversas situações, exigindo que os profissionais responsáveis pela implantação do sistema aprofundassem seus conhecimentos a respeito do assunto, pois, aos poucos esta regulamentação foi sendo incorporada às exigências dos Bombeiros de diversos outros estados brasileiros, evidenciando a sua importância.

Em decorrência do grave evento ocorrido na Boate Kiss, foi instalada pela ABNT uma Comissão de Estudo para a elaboração de uma norma brasileira de controle de fumaça com a atuação conjunta do CB24 – Comitê Brasileiro de Segurança contra incêndio e CB55 – Comitê Brasileiro de Refrigeração, Ar Condicionado, Ventilação e Aquecimento, com trabalho iniciado em abril de 2013 nas dependências da ABRAVA, estando hoje em estágio bastante avançado.

A participação dos membros do CB55 com a presença ativa das empresas do DNPC da ABRAVA é evidentemente fundamental, já que o controle de fumaça envolve instalações de ventilação, seja mecânica ou natural, com características específicas de robustez e confiabilidade.

A elaboração da norma tomou como base o texto da Instrução Técnica dos Bombeiros, que por sua vez foi redigida a partir de uma combinação de normas estrangeiras, com ênfase na Instrução Técnica nº 246, francesa, e a NFPA 92B, norte americana, cujos dados estão sendo atualizados de acordo com as versões mais recentes neste trabalho da ABNT. Um dos destaques neste trabalho refere-se ao maior detalhamento e diversificação dos locais onde devem ser exigidas as instalações de controle de fumaça, em comparação com as exigências da IT15 da qual ela se origina.

A norma em gestação estabelecerá os parâmetros técnicos básicos para a implementação do sistema de controle de fumaça e calor em incêndio, e tem como objetivo:

  1. a) manutenção de um ambiente seguro nas edificações, durante o tempo necessário para permitir o abandono do local sinistrado, pelos ocupantes da edificação e reduzindo o perigo de intoxicação;
  2. b) manter as rotas de escape e vias de acesso livres da fumaça do incêndio, permitindo a visualização da sinalização de orientação e a ação do sistema de iluminação de emergência;
  3. c) facilitar as operações de combate ao fogo pelas equipes de brigadistas e do corpo de bombeiros, que terão mais facilidade para visualizar o foco do incêndio e auxiliar nas operações de busca e resgate de pessoas;
  4. d) atrasar e/ou prevenir a ocorrência do “flash over” e, assim, o pleno desenvolvimento do fogo;
  5. e) proteger equipamentos, mobiliários e conteúdos das edificações;
  6. f) reduzir os efeitos térmicos em elementos estruturais durante um incêndio;
  7. g) reduzir os danos causados por produtos de decomposição térmica e gases quentes.

Mediante remoção da fumaça, o sistema de controle de fumaça e calor permite a formação de um vão livre de fumaça, abaixo de uma camada flutuante de fumaça, que se propaga pelo ambiente sinistrado, afastando o perigo de inalação de gases tóxicos e proporcionando visibilidade para garantir que os ocupantes abandonem a edificação de forma rápida e segura, e, ainda, possibilitar o resgate de pessoas feridas ou com dificuldades de locomoção.

Ao garantir melhor visibilidade também proporcionará melhores condições para o combate ao incêndio pois permitirá que os bombeiros localizem mais facilmente os focos de incêndio, aumentando a chance de extingui-los antes que se propaguem de forma incontrolavel.

O sistema é composto fundamentalmente por instalações de:

– Extração de fumaça,

– Suprimento de ar de compensação, e

– Controle.

A extração de fumaça que pode ser feita por meios mecânicos com o uso de ventiladores, ou de modo natural utilizando extratores de fumaça que são dispositivos montados na cobertura ou na fachada, tais como comportas que são acionadas para abrir de forma automática, ou, ainda, aberturas existentes na edificação, tais como um lanternim montado sobre o telhado de um galpão. A captação da fumaça é feita em posição alta, no interior ou na parte superior da camada de fumaça.

Áreas muito grandes são divididas em setores, chamados de “acantonamentos”, sendo que cada acantonamento recebe pontos de captação de fumaça independentes. Para a delimitação de um acantonamento em seu perímetro, podem ser usados os elementos da construção, tais como paredes e vigas, ou prever a instalação de barreiras que impeçam a passagem de fumaça entre acantonamentos adjacentes.

O cálculo do volume de fumaça a ser exaurido é estabelecido a partir dos dados de: tamanho de incêndio, taxa de liberação de calor em função do material queimado, altura da camada de fumaça e a temperatura da fumaça que é definida pela existência ou não de chuveiros automáticos na edificação.

O plumo de gases e particulados formado sobre o material em chamas vai se avolumando em seu trajeto ascendente devido à incorporação de ar em seu entorno, aumentando o volume de fumaça a ser extraído. Na medida em que a fumaça é removida do ambiente, é necessário repor o ar que foi expurgado para manter a estabilidade da operação do sistema. O suprimento de ar de reposição também é feito por meios mecânicos ou de modo natural, evitando-se, no entanto, fazê-lo no modo mecânico combinado com a extração natural.

Quando feito por meios mecânicos, o ar é lançado em posição baixa dentro do ambiente sinistrado para não gerar turbulência na camada de fumaça, sendo normalmente distribuído por dutos e introduzido por grelhas. É possível aproveitar as instalações de ar condicionado e ventilação previstas no edifício para suprir o ar de reposição, com as devidas adequações.

A introdução de ar de forma natural é feita por aberturas especificamente destinadas a esta finalidade e também por outras já previstas na edificação, tais como as portas de acesso ao ambiente sinistrado, sendo também possível fazê-la pelos vãos abertos entre acantonamentos vizinhos.

Para que tudo funcione de forma coordenada, é necessário um sistema de controle operando a partir de um sistema de detecção de fumaça que identificará a presença de fumaça gerada pelo fogo e enviará sinal ao controlador indicando a localização do incêndio. Confirmada a localização do fogo, será acionado o sistema de extração de fumaça mediante a abertura dos extratores de fumaça que normalmente é feito por motor elétrico ou pistão pneumático, ou o acionamento dos ventiladores exaustores em conjunto com a abertura dos registros nos dutos que atendem ao setor correspondente, sendo a fumaça expelida para fora do prédio.

Em seguida é acionado o sistema de introdução de ar, podendo ser de forma natural mediante a abertura de portas, janelas e registros, ou o acionamento dos ventiladores insufladores em conjunto com a abertura dos registros nos dutos que atendem ao setor correspondente, para permitir a entrada de ar no ambiente sinistrado.

Nos locais equipados com chuveiros automáticos, estes não deverão entrar em operação antes do sistema de controle de fumaça, devendo ser especificados para operar quando a fumaça atingir uma temperatura mais elevada do que o padrão usual adotado de modo a não interferir nas condições de visibilidade, o que é fundamental para permitir a fuga dos ocupantes logo no início do incêndio.

Para que todos estes resultados sejam alcançados é primordial que o sistema de controle de fumaça seja instalado de acordo com um projeto corretamente elaborado, e que os ensaios para verificar a efetividade de seu funcionamento sejam realizados de forma confiável durante toda a vida útil do sistema.

O controle de fumaça não é uma instalação feita para o uso cotidiano de uma edificação e desta forma não raramente acaba sendo menosprezado por aqueles que não entendem a sua importância, pois envolve custos e ocupação de espaços que muitas vezes são interpretados como “perdidos”. É um sistema que demanda apuro técnico em sua concepção e precisa ser projetado e instalado por profissionais de comprovada experiência e competência.

Carlos Kayano – diretor da Thermoplan Engenharia Térmica e membro do DNPC

A seção Projeto e consultoria tem seu conteúdo gerado a partir da iniciativa do DNPC da Abrava.

Veja também: Fumaça sempre foi a grande vilão dos incêndios

Controle de fumaça e fogo e pressurização de escadas

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