Introdução

Este texto apresenta conceitos técnicos e de gestão aplicáveis a projetos e a operação de laboratórios e tem o objetivo de alertar projetistas e consultores, fabricantes de equipamentos, instaladores, empresas de comissionamento e certificação, empreendedores, órgãos reguladores e usuários de laboratórios para a necessidade de aplicação de normas técnicas em projetos de sistemas de tratamento de ar para laboratórios, antes de sua construção, ou quando houver a necessidade de implantar melhorias e reformas em instalações existentes.

Recentemente o ASHRAE Technical Committee 9.10 – Laboratory Systems – Laboratory Classification Subcommittee em parceria com a American Chemical Society (ACS) – Division of Chemical Health and Safety e com a American Industrial Hygiene Association (AIHA) – Laboratory Health and Safety Committee publicaram um documento denominado “Classification of Laboratory Ventilation Design Levels” ou, em tradução livre, “Classificação de Níveis de projeto de sistemas de tratamento de ar para Laboratórios”. É recomendável a leitura do documento original que está disponível no site da ASHRAE (free download).

Esta matéria técnica toma o guia da ASHRAE como referência para apresentar reflexões, interpretações e estudos de caso que poderão ser úteis para os profissionais envolvidos em projetos, construção, inspeção e operação de laboratórios.

A publicação da ASHRAE tem adesão com as informações de publicações da ACGIH (American Conference of Governmental Industrial Hygienists), OSHA (Occupational Safety and Health Administration) e ANSI/ASHRAE Std. 62.1 – Ventilation for Acceptable Indoor Air Quality, entre outras.

Projetos integrados de laboratórios

O título “Projetos de sistemas de tratamento de ar para laboratórios”, por si só, pode levar a uma interpretação conceitual equivocada, pois gerir a construção de um laboratório de forma compartimentada, sem integrar os profissionais das demais disciplinas que deveriam se associar para a construção do laboratório é fonte segura de falhas.

É certo que os sistemas de tratamento de ar têm importância relevante para alcançar os requisitos do usuário, mas é necessário que a especificação de portas, paredes, tetos e pisos, o leiaute do laboratório, seu mobiliário, equipamentos de processo, equipamentos de exaustão, fluxo de pessoas e materiais, procedimentos operacionais, requisitos de ensaios para a certificação formal de desempenho e avaliações dos especialistas em análise de risco estejam harmonicamente integrados e as suas decisões estejam detalhadamente registradas nos diversos documentos que compõem o projeto do laboratório.

Tal como ocorre em projetos de salas limpas, o investimento na formação de uma equipe multidisciplinar é fonte segura de sucesso no resultado final do empreendimento e reservar tempo adequado para as etapas do projeto conceitual, básico e executivo, aumenta a chance de sucesso do empreendimento.

Este texto dá foco para questões relativas a sistemas de ventilação, exaustão e ar condicionado de projetos de laboratórios, mas é importante ratificar que os sistemas de tratamento de ar sozinhos não podem assegurar o controle de todos os riscos químicos do laboratório e meio ambiente.

O National Institute for Occupational Safety and Health (NIOSHI) trata da hierarquia de controles das exposições a riscos ocupacionais. Engenheiros especializados em análise de risco devem estar integrados à equipe multidisciplinar desde a etapa conceitual do projeto.

Acrônimos, conceitos e terminologia

O documento do ASHRAE TC 9.1 referenciado na introdução apresenta algumas informações importantes para o entendimento de projetos de sistemas de tratamento de ar para laboratórios. Alguns destes conceitos estão apresentados a seguir, em tradução livre:

Produtos químicos perigosos aerotransportados (airborne chemical hazards): Substâncias químicas suspensas ou misturadas no ar e que apresentam riscos que podem ser controlados com técnicas de ventilação. São gases e vapores de substâncias químicas voláteis que apresentam inflamabilidade, corrosividade, reatividade, riscos de toxicidade, patogenicidade ou problemas de odor. Outros tipos de contaminantes transportados pelo ar podem incluir partículas, fumos e aerossóis que podem demandar estratégias de controle distintas das requeridas para o controle de gases e vapores.

Perigo (hazard): Qualquer elemento no local de trabalho que tenha o potencial de prejudicar as pessoas, a propriedade ou o meio ambiente. Os riscos podem incluir objetos de trabalho, como maquinário ou produtos químicos, materiais biológicos e radioisótopos. Com relação aos perigos no ar, a gravidade do perigo é inerente às propriedades do material aerotransportado.

Faixa de controle (control banding): Sistema de identificação e avaliação de riscos que organiza as informações sobre perigos e processos em grupos, com base em sua relevância com relação a preocupação de saúde e segurança. Os fatores a considerar ao fazer essa designação no contexto da ventilação de laboratório incluem risco químico, quantidade e o potencial de emissões transmitidas pelo ar nos laboratórios e na construção. É importante notar que alguns processos podem ficar fora de um sistema específico de faixas de controle devido a riscos ou aplicações incomuns. Determinar se uma área, um dispositivo ou um processo específico é apropriado para a faixa de controle é o primeiro passo para se fazer uma atribuição de faixa de controle.

Laboratório ou ambiente em escala de laboratório (Laboratory Scale): são ambientes onde as reações, transferências e outras tarefas são realizadas utilizando-se recipientes que podem ser facilmente manipulados de forma segura e sem restrições por uma pessoa. Ao mesmo passo que esta definição não limita os tipos ou a gravidade dos riscos químicos, ela limita a quantidade de materiais potencialmente liberados no ambiente em cerca de 4 L ou menos, por processo (OSHA). Ambientes utilizados para a produção comercial de produtos químicos não fazem parte desta definição.

Risco (risk): Quando o contato com uma dada concentração de contaminantes no ar é suficiente para causar danos às pessoas (morte, ferimento ou doença), propriedade (degradação ou corrosão) e ao meio ambiente (poluição).

Eficácia da ventilação (ventilation effectiveness): A capacidade de reduzir o acúmulo de concentrações inseguras através dos mecanismos combinados de diluição e remoção de contaminantes em toda a sala do laboratório. A obtenção de um ambiente com boa diluição é uma função da taxa de renovação de ar, enquanto a eficácia da ventilação é uma função dos padrões de fluxo de ar resultantes de como o ar é suprido e exaurido do espaço controlado. Aumentar a taxa de renovação de ar pode não ter um efeito positivo na eficácia da ventilação. A vazão de ar novo e a difusão do ar no interior do laboratório devem ser cuidadosamente projetados para assegurar a eficácia da ventilação, evitando-se zonas mortas ou com jatos de ar que interfiram no funcionamento de capelas de exaustão de gases e vapores, coifas e outros sistemas de segregação do laboratório.

Acrônimos adotados neste texto:

LACS – Laboratory Airflow Control System. Será traduzido neste texto como Sistema de Tratamento de Ar do Laboratório (STAL).

ECD – Exposure Control Device (ASHRAE) ou Separative Device (conforme ISO 14644-7) serão traduzidos neste texto como Dispositivo de Segregação (DS). São equipamentos ou dispositivos utilizados em processos com emanações de maior risco como capelas de exaustão de gases e vapores, armários de solventes ou produtos químicos, braços de extração com campânula, coifas, cabines de segurança biológica, glove-boxes e cabines (mini-environments) que deverão ter seus projetos integrados ao projeto do laboratório.

LVDL: Laboratory Ventilation Design Level (Nível de Projeto de STAL). Neste texto manteremos o acrônimo do texto original da ASHRAE.

O controle de perigos no ar do laboratório e meio ambiente

Os sistemas de tratamento de ar para laboratórios (STAL) são a principal ferramenta de engenharia para reduzir o potencial de danos às pessoas, propriedades e ao meio ambiente, controlando a acumulação e a migração de perigos químicos gerados no laboratório e transmitidos pelo ar. As técnicas de controle de ventilação incluem contenção, captura, diluição e remoção de riscos químicos no ar do laboratório.

O projeto dos sistemas de insuflação e exaustão de ar e a ejeção segura de contaminantes transportados pelo ar para o exterior do edifício também inclui o leiaute físico ou a topografia do laboratório. Esta geometria afeta os padrões de fluxo de ar dentro do ambiente controlado. O grau de proteção proporcionado pelo STAL depende do projeto, operação e uso coordenado de todos esses componentes.

A definição dos sistemas de tratamento de ar antes da ejeção dos contaminantes gasosos para a atmosfera deve levar em conta diversos fatores de risco para a vizinhança e também para o próprio laboratório (risco de contaminação cruzada). Análise fluidodinâmica computacional (CFD) é uma ferramenta de modelagem que pode ser utilizada para dar mais segurança às decisões do projeto.

O risco de exposição a concentrações perigosas de substâncias químicas no ar em laboratórios pode variar de insignificante a extremo, dependendo das atividades realizadas nos ambientes, dos tipos de produtos químicos perigosos, das quantidades de materiais, das características de geração, da duração da exposição e da proteção proporcionada pelo fluxo de ar do laboratório e pelos sistemas de controle de contaminantes aéreos.

O propósito dos STAL é duplo: ele deve contribuir para conter a exposição excessiva a riscos químicos transportados pelo ar na condição normal de operação e também atender aos requisitos de filtragem, temperatura e umidade, para o conforto térmico dos ocupantes e para atender aos requisitos dos equipamentos de processo do laboratório e, eventualmente, às pressões em relação à atmosfera e a ambientes vizinhos (por exemplo: escritórios da administração do edifício).

A introdução não controlada de ar exterior através de furos e passagens de tubulações, sobre forro, eletrocalhas ou, ainda, pela falta de procedimentos de controle de acesso ou problemas de manutenção em portas de ingresso e egresso de pessoas e materiais do laboratório, pode causar a introdução de contaminantes externos e causar redução da vida útil dos equipamentos de processo do laboratório.

A admissão de ar exterior (ar novo ou ar de renovação) deve ocorrer através de uma ou mais vias projetadas para esta finalidade, com a adequada filtragem, resfriamento e desumidificação. A umidade excessiva e a entrada de poeiras nos laboratórios podem causar a formação de fungos em lentes de equipamentos óticos ou não atender a requisitos de equipamentos do laboratório, interferindo na confiabilidade dos resultados das análises.

O projeto deve especificar recursos na instalação dos sistemas de tratamento de ar para que a vazão de ar de renovação possa ser verificada de forma rápida e confiável, a qualquer tempo, através de procedimentos metrológicos recomendados pela ASHRAE.

Para assegurar que os Limites de Tolerância de exposição do trabalhador a agentes químicos não sejam ultrapassados (ver NR-15 – Anexo n°11 – Quadro n° 1 ou documento equivalente da ACGIH) ou ainda em função das demandas de exaustão de capelas, cabines de segurança biológica e outros pontos de captação local do laboratório é comum a utilização de taxas de ar externo que impõem relevante consumo de energia e, eventualmente, água (em torres de resfriamento).

Nestes casos, durante o projeto conceitual é importante que o projetista faça a avaliação de custos e soluções técnicas para o ciclo de vida da instalação. A utilização de sistemas de automação que mantenham o laboratório operando com a menor taxa de ar externo possível, quando a totalidade das vazões de exaustão não for necessária, e com a utilização de capelas de exaustão preparadas para trabalhar com sistemas de volume de ar variável e recursos para manter a guilhotina fechada quando não há manipulação, e, ainda, a utilização de sistemas de recuperação de energia, podem ser altamente compensatórios e devem ser apresentados ao empreendedor.

No entanto, é importante lembrar que a segurança laboratorial é um requisito inviolável e não deve ser sacrificada por ganhos de produtividade ou eficiência operacional.

Há instalações em locais com deficiências importantes na qualificação dos profissionais de manutenção. Nestes casos, sistemas complexos poderão perder a sua eficiência com o passar dos anos e talvez seja melhor optar por STAL “menos inteligentes”, mas que sejam bem manejados pela equipe de manutenção e operação. Esta é uma decisão que deve ser tomada pelo empreendedor, com a orientação do projetista.

O laboratório deve ser instrumentalizado para que os trabalhadores tenham condição de monitoramento dos parâmetros críticos dos sistemas de tratamento de ar a qualquer tempo. Sistemas de alarme sonoro e visual devem estar presentes nas capelas de exaustão e dispositivos de segregação e exaustão (DS) em geral e também nos ambientes do laboratório para alertar o trabalhador em caso de falhas.

Caso ocorram acidentes com derramamento de produtos químicos pode-se prever modos de funcionamento dos STAL para condições de contingência, com aumento da taxa de ar exterior, associando-se a controles administrativos, de proteção pessoal e controles de engenharia.

Componentes típicos dos Sistemas de Tratamento de Ar de Laboratórios

A Figura 1 apresenta um caso típico de projeto de laboratório com 70,5 m² e que tem seis capelas de exaustão de gases e vapores, com 100% de renovação de ar. Os principais resultados de cálculo são apresentados no fluxograma de ar. É possível identificar alguns engineering checks que alertam sobre o impacto energético diferenciado de projetos de laboratórios quando operam a plena carga, em condição de verão.

2,6 m²/TR; 219 m³/(h.TR); 28 renovações/h; 82 m³/(h.m²) de ar novo

Figura 1 -Fluxograma esquemático de um laboratório com 6 capelas de exaustão de gases

O controle de umidade relativa máxima e a utilização do laboratório em condição de inverno pode requerer a utilização de baterias de resistências elétricas ou serpentinas de aquecimento que também são consumidores de energia. O engenheiro mecânico deve avaliar a possibilidade de utilização de bombas de calor ou sistemas de desacoplamento de calor sensível do calor latente, ou outras técnicas que permitam reduzir o consumo de energia do laboratório, lembrando que há instalações com dezenas de capelas de exaustão e sistemas de captação local.

A publicação Laboratory Design Guide – Planning and Operation of Laboratory HVAC Systems da ASHRAE é uma referência de estudo para projetistas e usuários. Cabe ao engenheiro mecânico responsável pelo projeto avaliar a melhor solução junto com o seu cliente.

A Figura 2 apresenta um laboratório com capelas de exaustão que operam com caixas de volume de ar variável em função da posição da guilhotina. O STAL modula a vazão da unidade de tratamento de ar externo de forma a otimizar o consumo de energia do laboratório, quando a demanda de exaustão é reduzida.

Ensaio de contenção em capelas de exaustão e o consumo de energia

Métodos de ensaio para avaliação de desempenho de capelas de exaustão de gases e vapores são recomendados pela EN 14175 – Fume cupboards (partes 1 a 7) e pela ASHRAE Std. 110-2016 – Method of testing performance of laboratory fume hoods.

Estes documentos recomendam a aplicação de ensaios desafiadores para assegurar que a capela “em fábrica” ou “como instalada” tenha desempenho adequado.

O ensaio de contenção (containment test ou tracer gas test) utilizando o hexafluoreto de enxofre (SF6) é aplicado para validar o desempenho aerodinâmico das capelas e consolidar as vazões de ar de exaustão que deverão ser mantidas para assegurar a segregação do contaminante no interior da capela. Para estas vazões de trabalho o fabricante fornece também a perda de carga da capela que deverá ser considerada para a seleção do exaustor.(Figura 3)

Estas normas não especificam a taxa de vazão de face mínima (m³/h.m² ou m³/h.m) ou a velocidade de face mínima, permitindo que os fabricantes e projetistas trabalhem juntos para manter a capacidade de contenção da capela, mesmo com vazão de face menor que as referenciadas em manuais de engenharia de ventilação como a taxa de vazão de face de 1463 a 1829 m³/h.m² (80 a 100 cfm/ft²), apresentada pela ACGIH em sua publicação Industrial Ventilation, para certas condições de difusão do ar do ambiente do laboratório.

Com base nestes requisitos podemos considerar que uma capela convencional com largura nominal de 1,2 m (largura útil de 1 m) e altura de abertura da guilhotina de 500 mm teria de manter velocidade de face média de 0,41 a 0,51 m/s ou 738 a 918 m³/h.m para atender a recomendação do Industrial Ventilation.

É prática corrente a especificação de velocidade de face mínima de 0,5 m/s partindo de usuários e de alguns fabricantes de capelas de exaustão. Talvez esta seja uma prática que tenha de ser reavaliada, pois também temos fabricantes que utilizam velocidades de face significativamente menores em capelas de alta eficiência.

Uma capela de alta eficiência com largura nominal de 1,2 m (largura útil de 1,15 m) pode operar com velocidade de face mínima de 0,24 m/s e altura de abertura da guilhotina de 500 mm. Desta forma o equipamento pode trabalhar com 497 m³/h ou 432 m³/h.m. Estes dados podem ser encontrados em catálogos de fabricantes que investiram no desenvolvimento de capelas com melhor desempenho aerodinâmico. Estas capelas são certificadas em conformidade com a EN 14175 e têm contenção assegurada com aproximadamente metade da vazão das capelas convencionais.

Sequer podemos afirmar que capelas convencionais que operam com velocidades de face de 0,5 m/s são eficientes, pois normalmente não temos estes equipamentos submetidos aos ensaios de contenção com o hexafluoreto de enxofre, que é a referência de ensaio de maior credibilidade para assegurar o desempenho das capelas de exaustão.

O engenheiro mecânico responsável pelo projeto do STAL deve utilizar softwares de simulação de consumo energético para verificar a viabilidade de investir em capelas de exaustão certificada e de alta eficiência energética.

Antes da tomada de decisão do investimento os empreendedores devem ser orientados com relação a importância do custo de energia ao longo da vida útil da instalação e no investimento em equipamentos que tenham passado por processos de certificação previstos nas normas EN 14175 e ASHRAE Std 110.  Via de regra o ônus de comprovar que o trabalho ocorre em um ambiente salubre é do empregador e toda evidência de que as normas técnicas e as boas práticas de engenharia estão sendo atendidas acrescentam segurança para as relações entre o empregador e o trabalhador.

A compra das capelas de exaustão de forma desconectada do projeto do STAL não é recomendada. Via de regra a compra de capelas e de braços extratores está sob a gestão do time que está cuidando da compra do mobiliário do laboratório. É recomendável que estes profissionais façam parte da equipe multidisciplinar.

No Brasil a ABNT/CB-55 tem uma Comissão de Estudo (CE-055:002.001) trabalhando no projeto “Capelas de exaustão química – Método de ensaio”. Trata-se de um esforço de nossos fabricantes, usuários, projetistas, órgãos de governo e entidades de classe para melhorar a qualidade de nossos produtos e serviços.

Dispositivo de segregação especiais

Existem equipamentos de laboratório com geometrias excêntricas ou com superfícies quentes, onde a emanação de contaminantes pode ocorrer de forma não convencional. Nestes casos, soluções comerciais de segregação dos contaminantes, como capelas de exaustão ou braços extratores com mini coifas, podem não ser suficientes para reter os contaminantes de forma eficiente.

Coifas e mini coifas com braços extratores são dispositivos cujo desempenho pode ser significativamente impactado por determinadas condições do ambiente do laboratório e também por sua posição em relação à fonte de emanação de contaminantes.

A simples existência de um ponto de exaustão localizada não assegura a proteção do trabalhador.

O cuidado com a difusão de ar do ambiente do laboratório e os procedimentos operacionais associados a manipulação devem ser cuidadosamente planejados para que estes dispositivos segreguem o contaminante de forma eficiente.

Legar a responsabilidade de avaliar o desempenho de sistemas de exaustão especiais para a empresa de comissionamento durante o start-up é arriscado, pois, podemos chegar à conclusão que o dispositivo de segregação não tem desempenho adequado por falhas no seu projeto justamente no momento em que está sendo feita a entrega do STAL.

Quando um dispositivo padrão não consegue segregar a emanação de um equipamento não convencional é necessário que a equipe multidisciplinar elabore um projeto de um sistema de captação local junto com o especialista dos sistemas de tratamento de ar. Eventualmente o encabinamento do equipamento do laboratório pode ser a solução mais viável.

Após a conclusão do projeto é recomendável construir um protótipo do sistema de captação local e realizar ensaios desafiadores, em fábrica e no laboratório, para validar o desempenho da técnica que foi definida no projeto do dispositivo. Finalmente ensaios “em operação” servirão de referência final para reduzir o risco.

Níveis de projeto de sistemas de tratamento de ar para laboratórios

O guia Classification of Laboratory Ventilation Design Levels permite que o projetista defina as principais características do STAL, desde que o usuário forneça as características dos produtos químicos que serão manipulados no laboratório.

A capacidade de proteção proporcionada por um STAL deve ser compatível com o nível de risco associado aos produtos químicos aerotransportados.

São cinco níveis de projeto (LVDL – Laboratory Ventilation Design Level) que variam de LVDL-0 a LVDL-4. Os atributos e especificações para cada LVDL destinam-se a fornecer níveis crescentes de proteção e controle de riscos químicos transmitidos pelo ar para minimizar o risco de superexposição.  Especificamente, um STAL com atributos e especificações associados ao LVDL-0 oferece o nível mais baixo de proteção para trabalhar com substâncias químicas perigosas no ar, enquanto um STAL projetado e operado de acordo com as recomendações do LVDL-4 oferece o mais alto nível e controle de contaminantes aerotransportados.

A tabela 1 apresenta um diagrama conceitual de associação dos cinco níveis de projeto com os incrementos de riscos decorrentes dos contaminantes aerotransportados e, por outro lado, com a capacidade de proteção e com os custos de construção e operação do STAL.

 

Enquanto LVDL mais altos podem aumentar a capacidade de proteção do laboratório, eles também aumentam os custos de construção, resultam em maior consumo de energia, aumentam os custos operacionais e o esforço necessário para gerenciar e manter o desempenho da instalação. Essas considerações devem ser cuidadosamente avaliadas pelo projetista e o seu cliente.

As tabelas 2 e 3 foram parcialmente extraídas da referência de classificação de projeto da ASHRAE (em tradução livre). Fornecem requisitos de projeto físico e especificações operacionais para um STAL.

Tabela 2 – Características gerais e tipos de laboratórios associados com o LVDL

 

Tabela 3 – Exemplo de requisito de projeto e operação em função no Nível de Projeto (LVDL)

A Ficha de Informações de Segurança de Produtos Químicos (FISPQ – NBR 14725-4:2014) fornece a Classificação GHS – Globally Harmonized System of Classification and Labeling of Chemicals (OSHA GHS n.d.) onde se pode encontrar a informação dos Elementos da Etiqueta GHS. Entre estas informações temos as “Frases de Perigo”.

Exemplo para o Etanol:

– Frase de Perigo H225; Perigo: Líquido e vapor facilmente inflamáveis

– Frase de Perigo H319; Perigo: Provoca irritação ocular grave

Conhecendo as quantidades de materiais perigosos manipulados (Quantities of hazardous materials), o potencial de geração de contaminantes aerotransportados (Potential for airborne generation) e a gravidade do perigo (Hazard Severity), o engenheiro responsável pela análise de risco deve conduzir a definição do Nível do Projeto do STAL, utilizando a tabela 2 do documento de classificação da ASHRAE, apresentada neste texto de forma parcial e com tradução livre. Este é um trabalho que deve ocorrer em conjunto com o engenheiro mecânico responsável pelo projeto do STAL e com o usuário do laboratório.

Durante o projeto conceitual, em decorrência das definições do usuário e do engenheiro de análise de risco, o engenheiro mecânico pode ter de optar por STAL com técnicas de controle de contaminantes complexas que geram custos de construção e de operação não viáveis para o empreendedor. Nestas situações a equipe multidisciplinar se reúne e reavalia as quantidades de produtos manipulados, as técnicas para reduzir a emanação ou até mesmo a mudança de conceito de multifuncionalidade do laboratório para tentar reduzir o Nível do Projeto (LVDL) e viabilizar os custos do empreendimento, sempre tendo em mente que a segurança laboratorial é um requisito inviolável.

Nesta etapa de projeto se define a simultaneidade de operação de capelas de exaustão, os requisitos de alimentação elétrica de emergência, de equipamentos reserva, de sistemas recuperadores de energia, de sistemas de automação e monitoramento e, também, os sistemas de filtragem e tratamento de efluentes gasosos.

Conclusões finais

Um laboratório é uma complexa ferramenta de trabalho e não apenas um edifício onde se incorporam equipamentos e mobiliário. São instalações necessárias para controlar a contaminação e proteger os trabalhadores que ficarão expostos a produtos químicos por tempo prolongado, proteger o patrimônio e o meio ambiente e, também, para assegurar a qualidade dos ensaios de matérias primas, produtos acabados e análises em geral.

Na indústria, os laboratórios geram as evidências de que os processos de fabricação ocorreram em conformidade (ou em não-conformidade) com os padrões de qualidade especificados, o que denota a importância complementar destas instalações.

O risco de passivos trabalhistas pode ser reduzido quando os documentos de projeto, comissionamento e certificação periódica são robustos e quando as capelas de exaustão são certificadas, atendendo os critérios da EN 14175 ou ASHRAE Sdt 110.

Infelizmente não é incomum a existência de laboratórios que utilizam sistemas de tratamento de ar que não estão em conformidade com as normas técnicas, sem a adequada renovação e difusão de ar, filtragem, controle de pressão, temperatura e umidade e que podem estar expondo o trabalhador, o meio ambiente e o patrimônio a riscos. Via de regra os laboratórios passam por processos de certificação frágeis e pouco desafiadores e, muitas vezes, não há recursos adequados de monitoramento das condições ambientais.

Os projetos de sistemas de tratamento de ar de laboratórios devem seguir a formalidade requerida pelo sistema CONFEA-CREA, com a emissão de Anotação de Responsabilidade Técnica (ART) gerada por um engenheiro mecânico que será responsável por assegurar que os documentos do projeto contemplam as normas técnicas, guias de boas práticas e recomendações de órgãos reguladores.

Na sequência, e com o mesmo rigor de rastreabilidade da responsabilidade técnica, durante a etapa de fabricação e montagem dos sistemas de tratamento de ar, um engenheiro mecânico deve ser responsável por assegurar que a construção está em conformidade com o projeto e, finalmente, durante a etapa de comissionamento, um engenheiro mecânico deve desafiar os sistemas de tratamento de ar, aplicando os ensaios dinâmicos desafiadores previstos na etapa de projeto, “em repouso” e “em operação”, e utilizando processos metrológicos recomendados pela ASHRAE.

É importante que os proprietários das instalações reconheçam que a definição do Nível de Projeto (LVDL) durante a etapa conceitual do projeto terá impacto sobre o tipo de atividades que poderão ser realizadas nos laboratórios depois de construídos.

Finalmente, devemos levar em conta que os laboratórios sofrem mudanças frequentes em função de ampliações, implantação de melhorias, mudanças de requisitos de equipamentos do laboratório e de produtos químicos manipulados, entre tantas outras razões. Nestes casos, é importante manter um sistema de controle de mudanças ativo, com a revisão dos documentos do projeto antes que ocorram novos trabalhos perigosos nesses espaços.

Eng. Miguel Ferreirós, Vice-Presidente do DNPC-ABRAVA

O conteúdo da seção Projeto e consultoria é supervisionado pelo Departamento Nacional de Empresas Projetistas e Consultores da Abrava (DNPC-Abrava)

 

 

 

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