O Brasil poderá gerar mais de 1 milhão de empregos, diretos e indiretos, na área de eficiência energética (EE) até 2030. A informação consta em um estudo inédito desenvolvido pelo Ministério das Minas e Energia (MME) em parceria com o governo da Alemanha, a fim de apresentar o atual cenário do setor no país e o potencial de geração de vagas dedicadas a EE na próxima década. A projeção apontada acima foi obtida considerando-se um cenário em que o país consiga atingir a meta estabelecida no Acordo de Paris, firmado em 2015. Em sua NDC (Contribuição Nacionalmente Determinada), o governo assumiu compromissos, como o aumento da participação de fontes renováveis em sua matriz energética e a promoção em 10% da eficiência energética no setor elétrico. Entretanto, o estudo apontou que o número de vagas ainda está longe do esperado para atingir esse objetivo. Dessa forma, mais do que um prognóstico otimista para o setor, a análise do MME demonstra que o país precisa de novas inciativas do mercado, programas de capacitação e políticas efetivas, se quiser se desenvolver no setor de eficiência energética nos próximos anos.

Na prática, atualmente, o país possui 11 mil vagas específicas para profissionais capacitados para planejamento e execução de projetos de EE. Para atingir a meta estabelecida, precisaria ter alcançado – ainda em 2018 – 27 mil posições no setor. Em relação aos empregos diretos, o número atual é de 130 a 140 mil empregos. Para cumprir a NDC, esse número deveria chegar a 450 mil até 2030. Segundo o MME, a quantidade de pessoas que gerenciam esses projetos é consideravelmente menor em relação ao número de profissionais que os executam (em torno de 1% a 25%), o que demanda a necessidade de mais qualificação para a implementação de novas iniciativas e estratégias no país. A estimativa apontou, ainda, que há de 30 a 60 mil profissionais buscando capacitação na área, mas ainda que estes profissionais se tornem qualificados, não há postos de trabalho para abarcar a demanda.

De acordo com o Ministério de Minas e Energia, apesar de a perspectiva de geração de empregos apontar para a criação de vagas em diferentes níveis de qualificação, uma parcela importante, de 25% a 60%, deverá ser voltada para profissionais com curso superior. Quanto à região do país, não houve avaliação específica, sendo considerado apenas que a maioria dos empregos será gerada em áreas de maior produção industrial. Já em relação às áreas com maior chance de criação de vagas, a construção civil foi a apontada como a que tem maior potencial.

Na avaliação do coordenador de Atividades Técnicas do Senai (Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial), Edson Pereira dos Santos, o país tem condições de qualificar mão-de-obra e potencial para desenvolver o setor. Na instituição de qualificação profissional, por exemplo, existem atualmente capacitações na área de eficiência energética desde a formação básica até o nível de gestão, incluindo uma pós-graduação com vivência internacional na Alemanha, na qual o profissional também atua. Os cursos, em sua maioria, são oferecidos nas unidades de São Paulo, mas há também qualificações no Rio de Janeiro, Bahia, Minas Gerais e Rio Grande do Sul, de acordo com a demanda de cada região.

Entretanto, de acordo com Edson Santos, a questão da eficiência energética ainda é subestimada pelas empresas brasileiras. Segundo o profissional, por se tratar de ações que trazem resultados no médio e longo prazos, há uma dificuldade para entender como a otimização do consumo de energia pode ter um retorno compensador para as organizações. Ele destaca ,ainda, que hoje existem linhas de financiamento para esse fim, mas pouco movimento do mercado. Para Santos, essa “é uma questão cultural” e é preciso haver uma mudança de postura das instituições para que o setor se desenvolva mais no cenário nacional.

“No Brasil, existem várias ações ainda não iniciadas. Se você pegar empresas de diferentes portes, pequenas, médias e grandes, a questão da eficiência energética ainda não é tratada com a devida relevância. Pouco conhecimento, poucos profissionais dedicados à implementação de melhorias, de gestão. Então, a partir do momento que as organizações enxergarem que as ações de eficiência energética não são custos e sim investimentos, acho que tem um cenário promissor para desenvolver novas oportunidades, incluindo o mercado de trabalho. Hoje, as organizações não têm efetivamente uma função dedicada para a gestão, para as ações de eficiência energética, então, isso acaba sendo colocado juntamente com outras atribuições, do tipo gestão de manutenção, gestão de produção, não têm uma área definida. E para isso existem algumas frentes, existem fomentos que estão sendo feitos para incentivar as organizações nos quesitos de eficiência energética, no quesito de gestão de energia, algumas ações do tipo Procobre, do próprio Procel, a própria Eletrobras, algumas instituições de ensino também, o próprio Senai, USP, Unesp, que visam apresentar um cenário de oportunidades na área de eficiência energética”, afirma o coordenador do Senai.

Questionado sobre a estimativa de geração de empregos na área de EE apresentada pelo Ministério de Minas e Energia, Edson Santos afirma que, em sua opinião, as tendências de geração de energia a partir de fontes renováveis e de construções sustentáveis podem fomentar a área nos próximos anos e fazer com que aumente tanto a procura, quanto a oferta de empregos.

“Tem várias instituições se antevendo a isso, se preparando para isso, em diferentes níveis, operacional, prática e estratégica, e novos títulos vão surgindo. Hoje, o que eu sinto como experiência é que o mercado ainda não está demandando esses profissionais. Então nós estamos colocando os profissionais formados no mercado, mas a demanda ainda está retida. Mas, a partir do momento em que isso se demasiar em aumento, em crescimento, em geração de novos empregos, provavelmente mais pessoas vão procurar essas formações. Que eu vejo que é a bola da vez. A questão de energia e a segurança energética é a bola da vez, tanto quando eu falo de geração, quanto quando eu falo em consumo. Então a geração eficiente, a gestão da geração, smartgrid, smart home, prédios sustentáveis, green buildings, isso tudo desenvolve um cenário de oportunidades e sempre aquele que se preparar, se capacitar na frente acaba absorvendo as melhores oportunidades”, avalia.

A engenheira paulista Carmen Miranda de Oliveira está entre os profissionais em busca de qualificação, apostando no desenvolvimento da eficiência energética no Brasil. Instrutora de formação profissional, ela decidiu se especializar com a pós-graduação em Eficiência Energética na Indústria oferecida pelo Senai. Em sintonia com que o estudo do MME indicou, ela acredita que a geração de vagas pode aumentar nos próximos anos, desde que haja maior estímulo para o setor.

“Acho que o Brasil está começando a se movimentar, pois foram criadas diversas vagas no setor. O que está faltando mesmo é uma melhor divulgação e incentivo para aplicar melhorias. Creio que, com esse incentivo, podemos superar fácil as expectativas na geração de vagas até 2030”, afirma a engenheira eletricista.

Iniciativa inédita

O estudo “Potencial de Empregos Gerados na Área de Eficiência Energética no Brasil de 2018 até 2030” foi resultado do projeto Sistemas de Energia do Futuro, desenvolvido por meio de uma parceria entre o Ministério de Minas e Energia do Brasil e o Ministério Federal da Cooperação Econômica e Desenvolvimento da Alemanha, através da GIZ, Agência de Cooperação Alemã. A ação integrada vem sendo desenvolvida desde 2017 com o objetivo de promover o uso de energias renováveis e a eficiência energética no sistema brasileiro de energia, interagindo com entidades como Empresa de Pesquisa Energética (EPE), Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS), Ministério da Educação (MEC) , Senai, além de associações setoriais. O projeto atua em quatro frentes, sendo uma delas diretamente ligada à educação profissional, buscando estimular as instituições de ensino a desenvolverem cursos profissionalizantes na área.

“A ideia é que essas instituições de ensino estejam preparadas para atender a demanda desses setores por profissionais devidamente qualificados, garantido a inserção dessas fontes na matriz energética e a implementação de ações de eficiência energética com qualidade e segurança. No âmbito dessa linha, tendo em vista que até então não se tinha conhecimento de nenhum estudo que apontasse a quantidade atual de pessoas trabalhando com eficiência energética e a quantidade necessária para que o país atinja a NDC, entendeu-se necessário conhecer esses números para que ações possam ser desenvolvidas com maior embasamento”, explica a assessora técnica da GIZ, Roberta Knopki.

Nesse contexto, o MME afirma que tem atuado de forma a promover o setor de eficiência energética, buscando identificar os entraves que impedem o mercado de se desenvolver e buscando soluções para fomentar a criação de empregos.

“Estamos desenvolvendo uma série de ações, em diversos setores. Para mencionar apenas os setores abrangidos pelo estudo, o Ministério tem estudado a possibilidade de tornar obrigatória a etiquetagem de edificações, o que gerará um número enorme de profissionais capazes de realizar o diagnóstico energético e a certificação de edificações para a obtenção da etiqueta. No setor industrial, estamos trabalhando junto ao mercado de motores elétricos reparados, a fim de disseminar boas práticas e conscientização para o bom uso desses serviços”, afirma a coordenadora-geral de Eficiência Energética do MME, Samira Sousa, destacando que o estudo analisou apenas os setores industrial e de edificações.

A necessidade de certificação compulsória em eficiência energética para edificações também é vista de forma otimista pelo gerente do Programa Nacional de Conservação de Energia Elétrica (Procel), Marcel Siqueira. Ele avalia que o programa, que é responsável por desenvolver ações que visam ao uso racional de energia e por atestar a eficiência de equipamentos, também pode ser um impulsionador de geração de vagas.“O Procel tem um grande potencial de induzir o mercado, então, ao contrário de algumas ações de eficiência energética que visam só a implementação de maneira muito pontual, o Procel trabalha também, não só na implementação, mas desenvolvendo metodologias, desenvolvendo novas práticas de eficiência energética, e tudo o que é gerado em termos estruturantes, que serve para ser utilizado também por outros agentes e para outros programas de eficiência energética”, ressalta.

Débora Anibolete, para o Procel Info

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