Como qualquer sistema ou equipamento mecânico, o ar-condicionado pode, com o tempo, apresentar queda no desempenho de suas funções básicas obrigando a intervenções corretoras. Por outro lado, não é raro acontecer de instalações com relativamente pouco tempo de vida apresentarem deficiências que as desviam do objetivo central que é, segundo Hernani Paiva, diretor geral para América Latina da IMI Hydronic Engineering, a de “garantir totalmente as condições de projeto estabelecidas pelo projetista segundo os requisitos do cliente final.”

Como diz o projetista Francisco Pimenta, diretor da Climatizar e presidente do Departamento Nacional de Empresas Projetistas e Consultores (DNPC) da Abrava, é o sistema de água gelada aquele em que é possível “aplicar a engenharia de ar-condicionado em sua essência. Nele, a demanda térmica (calor sensível + calor latente) da edificação é retirada com maior eficiência, conseguindo-se atingir as condições térmicas básicas de conforto (temperatura e umidade relativa) em cada ambiente climatizado. Porém, o bom desempenho dele depende de vários fatores, iniciando com uma concepção racional feita no contexto de um bom projeto AVAC, passando por uma instalação de qualidade e culminando com uma operação que consegue conciliar a ‘corrida’ atrás de economia de energia e o respeito aos parâmetros de projeto, concebidos no início do processo. O comissionamento do sistema de ar-condicionado perpassa por todas estas etapas e é um garantidor da qualidade do resultado. Portanto, também é indispensável a sua contratação.”

De acordo com Paulo Teixeira, gerente comercial da Mayekawa do Brasil, “o que define o bom desempenho dos sistemas de água gelada é o desenvolvimento adequado do projeto, desde a fase conceitual até a elaboração das especificações para contratação dos fornecedores, respeitando as características do processo ou da climatização em que o sistema será instalado.” Em sentido contrário, ele atribui à falta de conhecimento para a correta operação, além da falta de planejamento de manutenções periódicas, as razões centrais para que um sistema de água gelada deixe de atender os requisitos de projeto.

Visão não muito diferente é exposta por Leandro Medéa, engenheiro de aplicação da Belimo Brasil. “O principal ponto (para o bom desempenho dos sistemas) é a correta escolha do tipo de sistema que será utilizado e o dimensionamento dos equipamentos pelo projetista responsável. Também possui papel fundamental a escolha de uma empresa qualificada para realizar a instalação, manutenção e operação do sistema escolhido, como realizar o comissionamento da obra e garantir que os equipamentos irão operar dentro das configurações de projeto.”

“O bom desempenho é definido por um sistema que redefine sua temperatura de ponto de ajuste de água gelada dependente da temperatura externa do ar, que maximiza as torres de resfriamento para fornecer a menor temperatura possível de água condensada para os refrigeradores, que sequencia seus resfriadores com base em sua eficiência e não em sua capacidade”, pontua Wilson José de Souza, supervisor regional de vendas da Armstrong.

Deterioração das condições de projeto

Sem dúvida, todos concordam que são várias as razões para os sistemas perderem as condições de projeto. “Como em qualquer outro sistema, o desgaste natural dos componentes da máquina é um fator que deve ser considerado e de entendimento geral dos responsáveis, aliado a uma falta de manutenção nesses equipamentos e acessórios, problemas de operação, configuração inadequada do sistema de automação, más condições do ambiente onde está instalado o sistema, e má qualidade da água. Essa somatória de problemas acaba fazendo com que o sistema sofra desgastes com o tempo”, opina Rafael Moura, da engenharia de aplicação da Mercato Automação.

“Todo sistema irá passar por um desgaste natural durante a utilização, porém, é fundamental garantir a correta manutenção preventiva e corretiva dos equipamentos que compõem o sistema de água gelada. A substituição de peças por novas e de igual qualidade e desempenho é um item fundamental para evitar a degradação da eficiência de um sistema em operação”, recomenda Medéa.

De acordo com Souza, os sistemas de água gelada deixam de atender aos requisitos do projeto quando a manutenção correta não é realizada. “Quando as serpentinas de resfriamento dos condicionadores estão muito sujas o fluxo de ar é reduzido levando à ocorrência da síndrome do baixo DT, refrigerante contaminado pelo lubrificante do compressor reduz a capacidade do chiller, ar livre não ventilado, filtros de água sujos, filtros de ar na AHU e FCU não substituídos ou limpos e feixes de tubos dos trocadores nos chillers sem limpeza são bons exemplos de itens de manutenção que, se não forem feitos como programado, farão com que um sistema de água gelada não atenda mais às suas necessidades.  O software ECO Pulse da Armstrong pode identificar quando uma Central de Água Gelada está perdendo eficiência, permitindo a antecipação das manutenções necessárias na planta, antes que os problemas levem a uma perda de capacidade do sistema”, pontua ele.

Paiva, da IMI, relaciona mais algumas causas para o mau desempenho. “Uma instalação inadequada, fora das melhores práticas de engenharia, com produtos similares, e não equivalentes, aprovados pelo projetista, falta de comissionamento, operadores do sistema sem qualificação técnica e falta de manutenção preditiva, preventiva e corretiva.”

Neste aspecto, é aconselhável ouvir o representante dos projetistas. “Para atender os requisitos de projeto, o primeiro passo é a empresa contratada para a instalação avalizar o projeto e se comprometer com o resultado. Sendo assim, ela irá fazer de tudo para que o projeto seja executado na íntegra, o que facilitará o alcance do objeto inicial traçado pelo projeto. Porém, quando isso não acontece, a probabilidade de o sistema não atender aos requisitos de projeto cresce muito e o controle da situação fica incerto. Esse comprometimento com o resultado também tem de estar junto à empresa responsável pela operação e manutenção do sistema AVAC, pois ela não pode tão somente preocupar-se com a eficiência energética, deixando de lado o conforto térmico e a qualidade do ar interno. Por fim, a não contratação de empresa de comissionamento é um fator significativo para que um sistema AVAC não consiga atingir os seus objetivos”, esclarece Pimenta.

Concepção de projeto

 É preciso reconhecer que a concepção do projeto tem o seu quinhão de responsabilidade no futuro desempenho da instalação. E, uma vez mais, ninguém melhor para falar a respeito do que o projetista Pimenta. “Como venho repetindo o que já escutei uma vez, nós projetistas não temos mérito algum em escolher equipamentos eficientes e de qualidade para compor o nosso projeto, é quase que uma obrigação. A concepção bem-feita de um projeto começa no entendimento dos anseios do investidor, do conhecimento a respeito da tipificação do edifício e na capacidade de escolher o sistema mais apropriado para a situação. Estes fatos já vão contribuir em grande parte para o bom desempenho do sistema. Mas, isso não é o bastante. O bom projetista deve conseguir fazer o cálculo de carga térmica correto e concatenar com habilidade as partes que compõem o sistema, ou seja: os equipamentos, a rede hidráulica, a rede de dutos, os elementos da difusão do ar, a automação e por aí vai. O objetivo final tem de ser, em síntese, atingir o conforto térmico desejado com o menor consumo de energia possível.”

Se é verdade que o projetista precisa saber o que o contratante espera do projeto, também esse tem suas responsabilidades. “O contratante deve contratar uma empresa de projetos bem-conceituada e de sua confiança, assim como quando procuramos o nosso médico. A partir daí, o projetista consegue pensar melhor na solução do prédio especificamente, tendo a consciência de que cada projeto é uma solução em particular. As partes, seguindo este rito, e o projetista se dedicando a cada parte do sistema, é o caminho para se obter eficiência no sistema AVAC”, defende Pimenta.

Não vamos deixar toda a responsabilidade sobre esses dois agentes. “É um consenso, ou deveria ser, do mercado de que a empresa de instalação é uma corresponsável pelo resultado. Porém, o contratante deve ter em mente a importância de contratar uma empresa com expertise reconhecida, experiência comprovada e comprometida. Sendo assim, facilita a preservação das condições de operação preconizadas no projeto. Isso porque uma empresa com estas características respeita naturalmente o bom projeto e até mesmo pode contribuir para melhorá-lo em determinadas situações de obra”, finaliza o presidente do DNPC.

Componentes do sistema

Coração do sistema de água gelada, o chiller joga um papel preponderante no desempenho da instalação. Daí, também, a importância a ele atribuída num processo de contratação. “O cliente deve atentar-se às normas NBR e às especificações estabelecidas como premissa para o seu processo. Por isso, buscar uma empresa com expertise no mercado é fundamental, pois conhecimento e experiência são fatores muitas vezes decisivos. Empresas como a Mayekawa, que possui mais de 54 anos de atuação, além de oferecer um portfólio de chillers para grande diversidade de processos, também se preocupa em auxiliar o cliente na escolha da melhor solução, mesmo que o cliente não possua as especificações técnicas para as suas necessidades”, diz Teixeira.

Os demais componentes merecem atenção igual ou até maior dos que os chillers no processo de contratação. As bombas d´água, por exemplo, se mal dimensionadas ocasionam graves problemas à instalação. “Maior área necessária para a instalação das bombas. Sistemas de tubulação extras e complicados para se adequar às bombas erradas.  Componentes caros e desnecessários, como bases de inércia e conexões flexíveis. Selos mecânicos internos, que requerem a remoção do eixo, rotor e mancal para serem substituídos”, esclarece Souza da Armstrong. Ele lista alguns produtos da empresa que constituem o estado da arte: bomba vertical in line de acoplamento bipartido de sucção simples, bomba vertical in line de acoplamento bipartido de sucção dupla e bomba vertical in line de acoplamento fechado de sucção simples.

Válvulas de controle

 Também área sensível de uma instalação, a especificação das válvulas de controle faz toda a diferença no desempenho do sistema de água gelada. “Existem vários itens que devem ser observados durante o selecionamento das válvulas de controle do sistema de água gelada. O principal item é a vazão necessária que o equipamento de condicionamento foi especificado, pois isso irá impactar diretamente no rendimento e controle realizado pela válvula. A pressão de close-off, classificação de pressão do corpo da válvula, pressão de trabalho, temperatura de trabalho, tipo de fluido e sinal de controle estão entre os principais itens para o correto selecionamento da válvula”, recomenda Medéa.

“O projetista precisa realizar a correta seleção da capacidade das bombas e do sistema que envolve a aplicação, também precisa entender a performance que esse equipamento terá que atingir, dimensionado de acordo com a demanda do sistema.  É de extrema importância observar a qualidade da água que circula no sistema, caso tenha uma baixa qualidade, poderá ser uma grande vilã e, ao longo do tempo, pode se manifestar através da corrosão das tubulações, com o acúmulo de materiais, formando uma crosta que comprometerá a fluidez do líquido”, alerta Moura.

Paiva chama a atenção, mais uma vez, para o respeito às exigências do projetista aos dados necessários para o dimensionamento correto do produto. “Normalmente seria vazão e diferencial de pressão do sistema, pois todas as válvulas trabalham segundo um diferencial de pressão, mesmo as independentes de pressão (muitos fabricantes omitem essa informação), e o mais importante, o ‘cérebro’ da válvula, que é o atuador. Se ele será tudo ou nada, proporcional, floating, 0-10V, 4-20mA ou alguma coisa parecida.  Se a válvula necessita ter informação na nuvem ou não. Tudo isso dependerá do nível de projeto e da criticidade em que o projetista e o cliente final exigem para performance do sistema.”

O balanceamento hidrônico é o processo de otimização da distribuição de água do sistema de aquecimento ou resfriamento de um sistema, ao igualar as perdas de carga do sistema, será possível atingir as condições de projeto do sistema, eficiência energética e operar com custos mínimos. Assim, a função básica de uma válvula de balanceamento é atuar no controle da pressão, direção e volume do fluído para equilibrar o fluxo nos ramais e garantir um bom funcionamento dos equipamentos. São dois os tipos de válvulas de balanceamento: estáticas e dinâmicas.

Quando o sistema apresenta uma distribuição a vazão constante, ou seja, não há flutuação de pressão sobre válvulas de controles, unidades de resfriamento, bombas e unidades terminais, é possível utilizar uma válvula de balanceamento estático.

“Dentro dos critérios que devem ser levantados na aplicação, caso o projeto atenda a necessidade de demanda sem muitas variações no fluxo do fluido, ou seja, manter-se constante, entende-se que a flutuação manométrica da bomba consegue manter o trabalho dentro da capacidade de força promovida, portanto pode-se aplicar uma bomba estática, onde o controle de fechamento e a variação deverão ser controlados no equipamento em que ela atua”, explica Moura.

“Válvulas de balanceamento estático só devem ser utilizadas em sistemas de vazão constante, porém, esse tipo de sistema se mostrou ineficaz, pois causava retorno de água gelada não consumida e mantinha as bombas operando a plena capacidade durante todo o tempo. Para aumentar a eficiência dos sistemas de distribuição de água, adotaram-se sistemas com vazão variável e utilização de válvulas de controle de 2 vias combinadas com variador de frequência nas bombas do sistema de distribuição. Atualmente, com a utilização de sistemas de água gelada com primário variável ou secundário variável, a utilização de válvulas de balanceamento estático caiu em desuso, pois quando aplicadas em sistemas variáveis, elas não conseguem realizar o correto balanceamento do sistema e prejudicam a eficiência e rendimento do sistema de água gelada. Hoje, a utilização de válvulas de balanceamento independente de pressão é fundamental para o sistema de água gelada, pois elas conseguem se adaptar às variações de pressões do sistema e balancear o sistema de forma eficaz e com grande eficiência”, completa Medéa.

Como se orientar em relação à especificação das válvulas? “O estado da arte são as válvulas com inteligência incorporada que garantem em qualquer situação de flutuação do sistema, alto ou baixo fluxo de vazão, o que o projetista especificou. Vale lembrar que a grande maioria dos projetos trabalham com baixa vazão após partida, e as válvulas têm que garantir a performance, evitando perda de rendimento e energia devido ao sistema trabalhar fora do ponto de operação especificado pelo projetista”, defende Paiva.

“Atualmente, com o avanço da tecnologia, existem válvulas que possibilitam monitorar o rendimento dos equipamentos, consumo de energia e implantar lógicas de eficiência para atingir o melhor rendimento do sistema. Esses equipamentos coletam dados de operação e, quando conectados em nuvem, permitem realizar análises e implementar lógicas baseadas nos dados reais de funcionamento do sistema”, informa Medéa.

“Outra tecnologia que podemos utilizar para aumentar o rendimento do sistema”, continua o engenheiro da Belimo, “é o gerenciamento do delta de temperatura do trocador.  O gerenciamento do DT de água gelada monitora e ajusta a vazão para o trocador atingir o delta projetado. Com essa função é possível aliviar o bombeamento de água gelada e melhorar performance das CAG e equipamentos de todo o sistema, pois a válvula irá monitorar e ajustar os valores de vazão para o melhor ponto de operação do equipamento. Hoje temos uma nova geração de válvulas que permitem a comunicação IoT e isso possibilita implantar lógicas para otimização dos sistemas através da análise dos dados em tempo real. Um exemplo são as válvulas de balanceamento e controle com IoT, a nuvem do fabricante irá coletar os dados e otimizar o trocador para obter o melhor rendimento através da análise dos dados em tempo real. Esse tipo de otimização poderá se estender para a grande maioria dos equipamentos do sistema e essa otimização passará a ser realizada através da análise de dados de todos os equipamentos que compõem o sistema de AVAC-R e não mais de apenas um fabricante ou um equipamento específico.”

“Desde que se iniciaram-se os estudos e levantamentos de dados referentes a eficiência de um sistema de água gelada, principalmente em busca de melhores performances e redução nos custos com energia elétrica, os periféricos que compõe o sistema estão diretamente ligados a esses números e vêm sendo aperfeiçoados de forma constante, as válvulas, especialmente, têm um papel crucial no direcionamento do fluido, que é responsável pelo bom funcionamento do sistema. Para uma boa especificação, é necessário além de um bom projeto, o conhecimento do tamanho do sistema, o tipo de edificação, o tipo e variação de cargas, e prestar atenção à mão de obra do local, para que a instalação e manutenção do sistema sejam garantidas pela mão de obra qualificada na região”, recomenda Moura, da Mercato.

Paiva, da IMI, conclui: “A melhor solução é entender o que o cliente final necessita para seu projeto. Quais equipamentos estarão envolvidos e quão grande é o sistema. Também, qual o investimento que o cliente pretende disponibilizar. Por isso, o comissionador é importante neste momento. O cliente não entende deste tipo de engenharia técnica e financeira, e vai necessitar de um consultor isento para garantir o melhor até o final do projeto.”

Veja também :

O conceito do projeto é um fator preponderante para toda a vida útil do sistema

Manutenção inadequada e operação deficiente provocam mau desempenho dos sistemas

Condições de operação dos sistemas de água gelada

Tags:, , ,

[fbcomments]