Com a implementação de Kigali, as regulamentações para o uso de fluidos refrigerantes estão claras e as empresas estão se movendo para tecnologias de baixo GWP. Isto implica em um ganho de fatias do mercado para equipamentos que estejam harmonizados com tendências de longo prazo. Isto é bastante verdade para os países industrializados, mas não totalmente para os países em desenvolvimento, chamados partes Artigo 5 do Protocolo de Montreal.  A questão do custo é uma variável importante para a conversão industrial da manufatura, que acaba se refletindo no preço do produto para o consumidor.

Atualmente, estima-se que mais de 85% do consumo de HFC seja para aplicações RACHP (Refrigeração, Ar-Condicionado e Bombas de Calor) (em termos de toneladas de CO2e). Três HFCs de alto GWP representam a maior parte do uso de HFC, são todos refrigerantes A1, ou seja, não inflamáveis e de baixa toxicidade (Tabela 1).

Tabela 1: HFCs de alto GWP e categoria A1 (não inflamáveis e de baixa toxicidade)

Gráfico: Contribuição setorial percentual para o consumo em CO2-eq de diferentes regiões em 2018, Velders et al. 2022

Para algumas aplicações já existem tendências claramente delineadas para a substituição dos atuais fluidos. Notadamente para as diversas aplicações do setor de refrigeração, onde alternativas de longo prazo, GWP baixo ou próximo de zero, estão tecnicamente e economicamente disponíveis nos diversos mercados. No caso das aplicações de ar-condicionado, principalmente para unidades compactas, existem alternativas, mas novos desenvolvimentos ainda estão em curso

Em síntese, já existem alternativas de GWP mais baixas disponíveis para quase todas as aplicações RACHP, os HFCs de alto GWP podem ser evitados em novos equipamentos.

Dependendo da aplicação, tecnologias com GWP < 10 estão disponíveis, incluindo HCs, CO2, amônia e HFOs. Em algumas aplicações, tecnologias com GWP <150 resultam em melhor desempenho, por exemplo, misturas HFO-HFC.  Para determinadas aplicações, poderão ser necessárias ainda uma fase de transição; tecnologias com GWP < 750, por exemplo, misturas de HFC-32 e HFO-HFC. (aqui se usa tecnologia para identificar refrigerante).

Como tendência, pode-se dizer que diferentes refrigerantes podem ser necessários. Muitos refrigerantes com baixo GWP são inflamáveis. Eles podem ser usados com segurança em pequenos sistemas e grandes sistemas em áreas de acesso limitado (por exemplo, sala de máquinas ou telhado). Refrigerantes inflamáveis podem ser mais problemáticos em sistemas de médio porte usados em áreas de acesso público; desta forma, refrigerantes de baixa inflamabilidade (A2L) podem ser frequentemente considerados, e refrigerantes de maior inflamabilidade (A3) só podem ser usados em quantidades limitadas com mais medidas de controle de segurança.

Tabela 2: Exemplos de tecnologias com GWP < 150 disponíveis para algumas aplicações de refrigeração

Tabela 3: Exemplos de tecnologias com GWP < 150 disponíveis para algumas aplicações de ar-condicionado e bomba de calor

Considerando HFCs de alto GWP, ainda vamos ver o uso de R-410A por um certo tempo, mas a substituição poderá ser mais rápida do que imaginamos. Tecnologias com GWP de até 750 podem ser necessárias para algumas aplicações. HFC-32 (GWP 675), misturas HFO-HFC (GWPs na faixa de 450 a 700). Atualmente existem tecnologias com GWP < 150 que atendem a ampla gama de aplicações do R-410A. Ver tabelas 3 e 4.

Um impacto importante é a necessidade crescente de capacitação técnica nos vários níveis para o uso de fluidos inflamáveis, principalmente A3 (hidrocarbonetos (devido ao uso crescente na refrigeração comercial plug-in.  O mesmo se pode dizer para os usos de CO2 transcrítico em supermercados.

Tabela 4: Exemplos de tecnologias com GWP de até 750 disponíveis para algumas aplicações de ar-condicionado e bomba de calor

As mudanças impulsionadas pela Emenda de Kigali ainda não afetam tão intensamente o mercado brasileiro, mas um exemplo claro é o do crescimento do uso de HC-290 (propano) como a principal alternativa para unidades de refrigeração comercial self-contained.

No cenário mundial, podemos verificar que alternativas aos HFCs de alto GWP estão disponíveis para a maioria das aplicações RACHP, mas há acessibilidade limitada a essas alternativas em alguns países A5.

Ainda há um desenvolvimento de novos refrigerantes com GWP mais baixo. Existem vários setores importantes de RACHP com alternativas GWP < 10 já amplamente disponíveis, por exemplo, HCs, CO2, amônia e HFOs. Em alguns mercados, opções com GWP de até 750 podem ser adotadas rapidamente. Para alguns mercados pequenos, o progresso para reduzir o GWP é atualmente lento.

Algumas aplicações ainda precisam utilizar refrigerantes com alto GWP, em setores com pequeno consumo de HFCs. Como em transporte refrigerado (caminhões, containers). Esta aplicação foi uma das principais usuárias de R-404A (GWP 3922) e o R-452A agora está disponível (GWP 2140).

Sistemas de temperatura ultrabaixa (por exemplo, freezers de vacinas a -70oC) que utilizam sistemas de refrigeração em cascata e no estágio baixa temperatura, podem usar refrigerantes com GWP muito alto, por exemplo, R-508B (GWP 13.396); opções de GWP mais baixas estão na fase de desenvolvimento.

Diversas tecnologias desenvolvidas nos últimos tempos são possíveis de aplicar com qualquer refrigerante (compressores de rotação variável, inverter, trocadores de calor de micro canais etc.).  Para refrigerantes alternativos, exclusivamente, eu destacaria as tecnologias desenvolvidas para permitir o uso de sistemas de refrigeração com CO2 transcríticos em regiões de temperatura ambiente alta, sem a penalização do maior consumo de energia. São elas: multi-ejetores e compressão paralela.

Dr. Roberto de Aguiar Peixoto, é professor do Instituto Mauá de Tecnologia, consultor de agências de implementação do Protocolo de Montreal e co-chair do Comitê de Opções Técnicas em Refrigeração, Ar-Condicionado e Bombas de Calor da UNEP

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