O uso de geotermia aplicado na produção de energia e para processos tem crescido de forma significativa em diversos países

  1. Introdução

O uso do solo como fonte de calor, ou para rejeição de calor, tem avançado na capacidade instalada e nas suas aplicações, sendo que a Fig. 01 mostra diversas aplicações de sistemas geotérmicos em diferentes setores.

Figura 1. Aplicações de sistemas geotérmicos em função da temperatura do solo (adaptado de Chiasson 2016)

 

Em função das características do solo e seu perfil de temperatura no Brasil, as possibilidades de aplicação de sistemas geotérmicos ficam restritas ao uso de água quente para banho e atividades recreativas (piscinas e spas) e resfriamento geotérmico (poços canadenses, chiller e bombas de calor).

  1. Tipos de sistemas

No que diz respeito aos tipos de sistemas de baixa profundidade (poço canadense – Fig. 02), o ar externo é insuflado e filtrado para tubulação enterrada no solo de forma a reduzir a temperatura do ar insuflado no ambiente atendido pelo sistema. Neste sistema, o ar é resfriado promovendo melhorias nas condições de conforto térmico da residência ou ambiente.

Figura 2. Esquema simplificado de poço canadense.

No caso de sistema com chiller ou bombas de calor com resfriamento geotérmico, tem-se como sistemas mais comuns:

  • Sistema aberto: o calor é rejeitado em um aquífero, rio, lago ou oceano. Neste caso, deve-se verificar se o aumento de temperatura no local da rejeição não ultrapassa níveis que possam prejudicar a fauna e flora local (Fig. 3a e b) (McQuay International. 2002).
  • Sistema fechado: o calor é rejeitado para o solo podendo ser realizado por 03 configurações mais comuns: slinky (horizontal/vertical – Fig. 04), horizontal (Fig. 05) e vertical (Fig. 06) (McQuay International. 2002).

Figura 3a: Sistema aberto (aquífero)

Figura 3b: Sistema aberto (lagos, rios e oceanos)

Figura 4: Sistema slinky (horizontal e vertical)

Figura 5. Sistema fechado horizontal

Figura 6. Sistema fechado vertical

Além destes sistemas, existe a possibilidade de se ter sistemas com torres de resfriamento (Fig. 7) ou com coletores solares (Fig. 08), de forma a otimizar a rejeição de calor ou utilizar o calor rejeitado pelos sistemas de resfriamento para o aquecimento de água para banho e/ou processo industrial.

Figura 7. Sistema híbrido (geotermia/torre de resfriamento) (adpatado de Sarbu and Sebarchievici 2014)

Figura 8. Sistema híbrido (geotermia/coletor solar) (adaptado de Sarbu and Sebarchievici 2014)

(Ali, Kariya, and Miyara 2017) avaliaram o uso do sistema slinky para residências em operação contínua e intermitente na posição horizontal e inclinada. Os autores verificam que o uso do sistema inclinado reduz em torno de 15% a capacidade de rejeição de calor em relação ao sistema horizontal. No caso do uso intermitente do sistema, os autores verificaram que, para períodos de intermitência de 06 horas, pode-se aumentar a capacidade de rejeição do sistema em até 25% em relação ao uso do sistema em operação contínua.

(Nóbrega et al. 2020) propõe modelo para prever o desempenho de sistemas de resfriamento geotérmico de baixa profundidade (ou poço canadense). Os autores analisam que, para as condições climáticas e de solo para a cidade de Pelotas, este sistema pode reduzir a temperatura do ar em até 06°C.

(Duarte et al. 2023) comparam modelos de sistemas de ar-condicionado convencional e geotérmico por aquífero aplicados para edifícios comerciais para as cidades de Belo Horizonte, Natal e São Joaquim. A comparação dos sistemas foi realizada para diferentes temperaturas do aquífero resultando em aumentos do coeficiente de performance do sistema de 6 a 34% com reduções de consumo de energia de 3 a 27%.

(Barla and Insana 2023) analisam o uso de paredes de túneis para rejeitar o calor para sistemas de climatização geotérmico por meio de um projeto piloto nos túneis do metrô da cidade de Torino. O artigo analisa os aspectos térmicos como estruturais para avaliar o impacto global do uso das paredes do metrô para rejeição de calor. A grande vantagem é o aproveitamento das paredes que terão que ser construídas e criar uma segunda função destes elementos (estrutural e rejeição de calor). Os autores avaliam que os efeitos estruturais podem ser contornados com alguns reforços específicos em função de análise estrutural dos túneis, sendo que se verifica que a capacidade de rejeição pode variar de 10 a 20 W/m2 (sem movimentação de água no solo) até 50 a 60 W/m2 (com movimentação de água no solo).

  1. Desafios e oportunidades para a implantação de sistemas de resfriamento geotérmico

As aplicações de sistemas de resfriamento geotérmico no Brasil são pontuais com uso do poço canadense ou sistemas de resfriamento residencial tipo slinky. Não se tem ainda registros do uso de sistema de resfriamento aberto ou fechado em edificações de maior porte, principalmente devido ao alto custo inicial para execução de perfuração para a implantação dos sistemas verticais e a demanda de áreas muito grandes para a implantação de sistemas horizontais.

Estudos realizados mostram que o tempo de retorno de investimento destes sistemas aplicados em edificações no Brasil variam entre 7 e 12 anos, dependendo da tipologia da edificação e o local da sua implantação. Esta variação ocorre, pois foram considerados sistemas verticais com perfuração (em inglês bore holes) cujo custo de perfuração é alto. Além disso, ao comparar-se estes sistemas de resfriamento geotérmico com sistemas convencionais (centrais de água gelada com condensação a água) deve-se considerar o maior investimento inicial combinado com a redução de consumo de energia e água, pois, no sistema de resfriamento geotérmico, temos um circuito fechado para a água de condensação, o que reduz os custos de operação relacionados ao tratamento de água e a reposição de água (make-up).

Diversos estudos mostram que o uso de bombas de calor geotérmico tem sido considerado como alternativa para redução de consumo de energia em diversos países e esta tecnologia já foi incluída na categoria de tecnologia disruptiva para redução de emissão de carbono nos relatórios do Balanço Energético Brasileiro.

No sentido de viabilizar, de forma mais efetiva, a implantação de sistemas de resfriamento geotérmico no Brasil, entende-se que esforços devem ser feitos para a redução de custos iniciais e/ou promover a produção combinada de aquecimento e resfriamento nestes sistemas.

Dessa forma, o uso das estacas (em inglês thermal piles), paredes e pisos (em inglês defragmented walls and floors) como estruturas para a rejeição de calor em edificações poderia reduzir substancialmente o custo inicial de implantação destes sistemas. Deve-se considerar, no uso destas estruturas, a carga térmica de resfriamento a ser rejeitada, pois a área disponível nestas estruturas pode não permitir a rejeição da carga térmica total. Nestes casos, pode-se investir em um sistema híbrido (geotermia+torre de resfriamento).

Além disso, a produção combinada de aquecimento e resfriamento pode reduzir ainda mais o custo de operação, viabilizando o investimento em sistemas de resfriamento geotérmico, sendo mais atrativa para tipologias como hotéis e hospitais.

  1. Conclusões

O uso de geotermia aplicado na produção de energia e para processos tem crescido de forma significativa em diversos países. No caso do Brasil, a aplicação de sistemas de resfriamento geotérmico se restringe a aplicações recreativas para aquecimento e para resfriamento geotérmico de edificações.

A ampliação do uso desta tecnologia passa por estudos que viabilizem a redução do custo inicial de implantação utilizando as estacas, pisos e paredes das edificações como suporte para os tubos para a rejeição de calor. Além disso, edificações que tenham a demanda combinada de energia para aquecimento e resfriamento podem fomentar a implantação de sistemas de resfriamento geotérmico.

Alberto Hernandez Neto, doutor e livre docente, é professor associado da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (Poli USP) no Departamento de Engenharia Mecânica

Referências

Ali, Md., Keishi Kariya, and Akio Miyara. 2017. “Performance Analysis of Slinky Horizontal Ground Heat Exchangers for a Ground Source Heat Pump System.” Resources 6 (4): 56. https://doi.org/10.3390/resources6040056.

Barla, Marco, and Alessandra Insana. 2023. “Energy Tunnels as an Opportunity for Sustainable Development of Urban Areas.” Tunnelling and Underground Space Technology 132 (February): 104902. https://doi.org/10.1016/j.tust.2022.104902.

Chiasson, Andrew D. 2016. GEOTHERMAL HEAT PUMP AND HEAT ENGINE SYSTEMS THEORY AND PRACTICE.

Duarte, Willian M., Tiago F. Paulino, Sinthya G. Tavares, Kássio N. Cançado, and Luiz Machado. 2023. “Comparative Study of Geothermal and Conventional Air Conditioner: A Case of Study for Office Applications.” Journal of Building Engineering 65 (April): 105786. https://doi.org/10.1016/j.jobe.2022.105786.

McQuay International. 2002. “Geothermal Heat Pump – Design Manual.”

Nóbrega, Eduardo De Sá Bueno, Ruth Da Silva Brum, Jairo Valões de Alencar Ramalho, and Régis Sperotto Quadros. 2020. “A First Study on Earth-Air Heat Exchanger in Pelotas.” Revista Mundi Engenharia, Tecnologia e Gestão (ISSN: 2525-4782) 5 (6). https://doi.org/10.21575/25254782rmetg2020vol5n61336.

Sarbu, Ioan, and Calin Sebarchievici. 2014. “General Review of Ground-Source Heat Pump Systems for Heating and Cooling of Buildings.” Energy and Buildings 70 (February): 441–54. https://doi.org/10.1016/j.enbuild.2013.11.068.

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