Diferente do R22 ou do R134a, que por décadas foram eleitos como os melhores fluidos refrigerantes para diversas aplicações de refrigeração, hoje há muitas dúvidas de qual caminho seguir na utilização de fluidos refrigerantes com baixo impacto ambiental. Observa-se a crescente demanda por sistemas que utilizam isobutano, amônia, CO2, propano e HFOs, mas o mercado brasileiro ainda não elegeu quais têm se mostrado mais viável em substituição aos HCFCs e HFCs.

“Os substitutos dos HCFCs e HFCs disponíveis hoje no mercado são os fluidos HFOs e os naturais, como o CO2, o propano, entre outros. Os que estão se mostrando mais viáveis até este momento são os fluidos naturais, não pela simplicidade de sua aplicação, mas principalmente pela longevidade do projeto, disponibilidade no mercado nacional, baixo custo de aquisição, e por atender toda demanda dos protocolos de proteção do meio ambiente. O R22 foi uma excelente alternativa por 30 anos, mas deixou prejuízos ao meio ambiente. Estou convencido de que as tecnologias dos refrigerantes naturais voltaram para ficar e teremos que trabalhar cada vez mais com as altas pressões do CO2, com a inflamabilidade do propano e com a toxidade da amônia, e, por essas tecnologias exigirem maior capacitação de pessoal técnico, precisará ser o foco das empresas do setor nos próximos anos. Há ainda os HFOs de alto e baixo GWP como substitutos dos HCFCs e HFCs na refrigeração comercial”, diz Rogério Marson Rodrigues, engenheiro e gestor industrial da Eletrofrio Refrigeração.

Ele lista algumas características dos HFOs de alto GWP, elevado se comparado às possíveis limitações que poderão ser impostas em um futuro próximo: similaridade de aplicação em relação aos HCFCs e HFCs, menor eficiência energética quando comparados aos HCFCs e maior eficiência energética quando comparado aos HFCs, desde que a comparação seja feita entre equivalentes, como R449A x R404A, R513 x R134a etc., alto custo de aquisição do fluido quando comparado aos HCFCs e HFCs, e distribuição limitada no mercado nacional.

“As limitações dos HFOs de alto GWP são os próprios índices do GWP, que poderão, ou não, limitar sua aplicação muito em breve. Não há consenso de qual o índice seguro para o meio ambiente, porém, a qualquer momento, poderemos receber novas determinações que os colocarão em programas de phasedown ou phaseout. Neste período de transição, não há segurança que esta alternativa é definitiva ou que terá muitos anos de sobrevida. Já os HFOs de baixo GWP são classificados como A2, pouco inflamáveis, exigindo projetos especiais que ofereçam ao sistema de refrigeração segurança operacional, além do alto custo de aquisição”, comenta Marson.

Alexandre Rosa da Costa, supervisor da engenharia de aplicação da Elgin, também acredita que ainda há dúvida do caminho a se tomar para o futuro dos fluidos refrigerantes: “O que observamos no mercado brasileiro em geral é a introdução dos fluidos naturais como propano, isobutano, amônia, além dos HFOs, que segundo as indústrias que distribuem estes fluidos, são similares às características do R134a, possuem zero ODP, baixo GWP, baixo índice de inflamabilidade, com boa eficiência e baixos custos para substituições pelos fluidos HCFs e HFCs, mas necessitam de mão de obra especializada com conhecimento de aplicação e cuidados para o manuseio”.

Na opinião de Costa, para linha comercial de pequeno porte (fracionada abaixo de 1 HP) o que se vê é a tendência da utilização de propano e isobutano. No caso das linhas maiores de 1 HP, a tendência é a aplicação do CO2 e amônia. Já para empresas de processos do ramo alimentício, a tendência é a aplicação de soluções de glicol como fluido secundário, alimentados por sistemas de amônia e/ou CO2.

Marson detalha as aplicações mais indicadas na refrigeração comercial para os refrigerantes naturais utilizados no Brasil:

– Propano (R290): Expositores frigoríficos tipo self-contained, para média e baixa temperatura, e sistemas de expansão indireta com a utilização de fluidos secundários como água gelada ou propileno glicol.

– Isobutano (R600): Refrigeração comercial leve.

– Dióxido de Carbono (R744): Sistemas de expansão direta ou cascata para média e baixa temperatura.

– Amônia (R717): Sistemas de expansão indireta com utilização de fluidos secundários para média e baixa temperatura.

– Soluções de glicol (fluido secundário): Aplicado em sistemas de expansão indireta como fluido secundário para alta e média temperatura.

– Sistemas em cascata: A combinação mais usual para um sistema tipo cascata aplicado na refrigeração comercial está na utilização do R134a no lado de alta para condensar o CO2 no lado de baixa; estuda-se a substituição do R134a por algum hidrocarboneto ou amônia, dando ao sistema cascata a condição de um sistema natural e com boa eficiência energética.

“Cada um dos fluidos naturais aplicados na refrigeração comercial brasileira possui características próprias que demandam cuidados especiais no projeto, fabricação, instalação, operação e manutenção: o CO2 com altas pressões de trabalho, o propano por ser inflamável, e a amônia por ser tóxica. Os HFOs de alto GWP possuem características de operação muito similares aos HCFCs e HFCs, desta forma, os equipamentos e componentes também são similares. Já os HFOs de baixo GWP, por serem classificados como A2, pouco inflamáveis, exigem equipamentos e componentes que atendam as demandas de segurança para esta condição”, explica o engenheiro da Eletrofrio.

Selecionamento de equipamentos e componentes

Cláudio Palma, diretor geral da Mipal, orienta sobre a utilização de equipamentos e componentes de acordo com as características de cada fluido.

“Cada um dos fluidos possui características próprias. O principal é que, no caso de condensadores e evaporadores, por exemplo, é necessário o uso de uma linha diferenciada, preparada para aguentar maior pressão. Investimos bastante em uma linha preparada para gases ecológicos há décadas, e hoje oferecemos opções com alta tecnologia, eficiência energética, com a qualidade e segurança em aletados. Para o selecionamento, é necessário especificar qual o gás escolhido para o sistema, pois influencia diretamente na circuitação dos equipamentos, bem como a velocidade dos fluidos, que deve estar adequada para maior eficiência. Por exemplo, o dióxido de carbono tem sido uma opção escolhida pelo mercado, porém, ele exige componentes eletrônicos específicos e uma linha diferenciada, além de mão de obra especializada. O uso dos HFOs ainda é corrente com a vantagem de favorecer a economia energética. O custo ainda é mais alto, porém, compensa na eficiência energética. Há estudos que falam de um payback de 10 a 12 meses. Mas ainda não é possível falar de sistemas mais usuais ou combinação mais usual e eficiente. O mercado está em fase de transição e muitas novidades ainda estão surgindo”, revela Palma.

Homero Busnello, diretor de marketing – América Latina da Tecumseh, acrescenta que os refrigerantes naturais, como os hidrocarbonetos, propano e isobutano, requerem especial atenção quanto a segurança dos componentes elétricos, os mesmos devem ser à prova de explosão, ou seja, não permitem que arcos voltaicos se formem fora de seu compartimento de funcionamento; há, portanto, o confinamento de tais arcos ou a ausência total desses em determinados componentes sólidos como relés de estado sólido, por exemplo.

“Já para o CO2, há que se considerar um bom projeto que permita ser seguro quanto às elevadas pressões de operação e isso influencia no projeto da tubulação, válvulas, entre outros componentes. No caso da amônia, a segurança quanto a vazamentos já é largamente conhecida e requer, como nos outros casos, cuidado muito especial, além de garantir que o manuseio dos equipamentos seja feito por pessoal altamente qualificado equipado e dentro das normas de segurança. Quanto ao melhor tipo de fluido a ser utilizado em substituição aos HCFCs e HFCs, tudo depende da capacidade frigorífica, por exemplo, se considerarmos o limite de 150 g de carga de gás, o propano – R290 é o escolhido e já encontra-se no mercado em uso regular. Há outros em processo de testes em clientes como o R449A que é um HFO recomendado para aplicações em baixa e média altas pressões de retorno. É importante lembrar que este fluido possui uma temperatura de descarga mais elevada, assim, recomenda-se que a aplicação seja estritamente dentro da janela de aplicação do compressor. Além desse ponto, outro fator crítico é a disponibilidade no Brasil, pois ainda é baixa sua oferta e seu custo de aquisição ainda elevado”, argumenta Busnello.

Na opinião de Gustavo Haverroth, gerente sênior de promoção e estratégia de produto da Embraco, o refrigerante que tem se mostrado mais promissor em aplicações comerciais de pequeno e médio porte é o propano (R290), sendo que a substituição de HCFC ou HFC por propano tem apresentado vários benefícios, entre eles, um ganho significativo no consumo de energia.

“Já para aplicações maiores, que hoje possuem um sistema de refrigeração remoto, tem-se discutido muito o conceito do sistema de refrigeração em si, com propostas que vão desde sistemas menores utilizando também o propano, conforme conceito do Embraco Plug N’cool, ou permanecer com sistemas remotos utilizando CO2 como refrigerante. Refrigerantes como propano e isobutano são inflamáveis e seu manuseio exige atenções especiais, além de profissional qualificado. Tomando os devidos cuidados, os refrigerantes naturais são seguros para serem aplicados. O CO2 trabalha com pressões extremamente elevadas, o que também exige cuidados especiais. Os HFOs puros (R1234yf e R1234ze) são considerados inflamáveis (classificados como A2L), possuindo assim restrições ao uso similar aos do R290 (limite de carga refrigerante, por exemplo). Além disso, por possuir características mais próximas ao R134a, não permitem a redução do compressor como é possível com o R290. Os HFOs mistos como R448A e R449A, não são inflamáveis, mas possuem o GWP bem mais elevado que os HFOs puros ou os refrigerantes naturais como R290, R600a e CO2, podendo em um futuro ser alvo de regulamentações ambientais, assim como já ocorre na Europa e em outros países. Além disso, possuem alta taxa de compressão, o que eleva demasiadamente a temperatura do compressor, não sendo assim uma solução que pode ser adotada sem ajustes. Sendo assim, a Embraco acredita que a melhor solução para substituição aos HCFCs e HFCs são os refrigerantes naturais como o R290. Os compressores devem estar aprovados para o uso com o HFO e dependendo do tipo de HFO, alterações adicionais podem ser necessárias. Os HFOs puros, por exemplo, exigem que todos os componentes do sistema sejam compatíveis com gases inflamáveis. Já os sistemas cascatas são utilizados principalmente em aplicações comerciais onde precisa-se chegar a temperaturas de refrigeração muito baixas (-86°C) para conservação de produtos altamente sensíveis. Sistemas médios que utilizam sistemas de cascatas geralmente aplicam combinações de refrigerantes patenteados pelas empresas para entregar a performance e confiabilidade desejada”, adianta Haverroth.

Paulo Neulaender, vice-presidente de Meio Ambiente da Abrava e diretor técnico ambiental da GPS Neulaender, lista alguns pontos importantes que devem ser levados em conta na especificação, como a performance dos novos refrigerantes que deve ser bastante similar à dos refrigerantes que eles substituem; o fluido refrigerante deve trabalhar em uma faixa de pressão e temperatura, com a temperatura de descarga não excedendo a temperatura limite de descarga do compressor; as pressões máximas do sistema não devem ser maiores do que os limites atuais aceitáveis no sistema – as tubulações e compressores devem suportar tais pressões; deve ser mantida a compatibilidade de materiais (elastômeros, vedações, o’rings etc.) entre os novos refrigerantes, materiais de construção do compressor e componentes do sistema (cobre, aço, alumínio etc.); deve-se garantir a miscibilidade e compatibilidade do fluido refrigerante com o óleo lubrificante (óleo mineral, poliol éster, alquilbenzeno) presente no sistema.

Fornecimento, utilização e manuseio seguro

Renato Cesquini, presidente do DN Meio Ambiente da Abrava e Arthur Ngai, ambos gerentes de negócios de produtos fluorados da Chemours no Brasil, apontam algumas soluções como opção de transição para fluidos refrigerantes de baixo potencial de aquecimento global e que visam também eficiência energética.

“A linha Opteon™ é uma categoria de produtos à base de Hidrofluorolefina (HFO) mais amigável ao meio ambiente, com zero potencial de degradação da camada de ozônio e baixo potencial de aquecimento global, além de ser seguro, com baixa flamabilidade ou não inflamável. Voltado à refrigeração comercial, o OpteonTM XP40 é o substituto imediato mais sustentável para o R22 e para o R404A. É a opção para varejistas e supermercadistas que precisam instalar novos equipamentos ou os que desejam realizar retrofit. A tecnologia dos equipamentos que utilizam HFC e HCFC é a mesma aplicada para fluidos da linha Opteon™, necessitando apenas adaptar alguns componentes do sistema. Outras alternativas de fluidos refrigerantes como CO2 ou hidrocarbonetos requerem mudança de projeto ou total reconfiguração do sistema demandando alto investimentos e maior tempo de parada. Por isso, mais de mil supermercados no mundo já utilizam a linha Opteon™, inclusive no Brasil”, dizem Cesquini e Ngai.

Para sistemas em funcionamento, eles recomendam as boas práticas da refrigeração com uma análise prévia das condições de operação, identificação de potenciais problemas e pontos de vazamento.  A partir de então, a troca para o novo fluido refrigerante pode ser feita verificando compatibilidade do fluido refrigerante com óleo lubrificante do compressor e possíveis ajustes necessários no sistema de expansão. Já para equipamentos de refrigeração comercial novos projetados para uso com o HFC (R404A) ou mesmo HCFC (R22), operam em condições muito similares ao OpteonTM XP40 e o fabricante poderia adaptar o sistema diretamente com os componentes requeridos.

Neulaender cita algumas recomendações para a utilização de fluidos refrigerantes, no caso de manutenções ou reposição em equipamentos existentes: “Pensando em boas práticas técnicas e ambientais, o ideal primeiro é trabalhar com uma manutenção preventiva, ter um melhor controle de fugas e fluidos e, no caso de manutenção, sempre recolher o mesmo para posterior destinação final ou reutilização através do processo de reciclagem e ou regeneração. Os riscos da utilização de fluidos de procedência duvidosa são vários, desde uma deficiência do sistema até uma queima severa do compressor, além de perigoso, pois sabemos que têm vários fluidos entrando no Brasil sem as normas ARI 700 e Ashrae 34, e produtos com concentração de gases inflamáveis acima das normas, entre outros tipos de contaminantes prejudiciais à saúde e ao sistema. A responsabilidade de um problema sério como este vai do técnico que aplicou o produto à empresa que comercializou o mesmo, todos de uma certa forma são responsáveis ou co-responsáveis”, conclui Neulaender.

Ana Paula Basile Pinheiro-  anapaula@nteditorial.com.br

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