Desafio é aliar baixo potencial de aquecimento global com reduzidos riscos de inflamabilidade e toxicidade
Não são poucos os alertas da ciência sobre a urgência da transição energética para responder à crise climática, com cada vez mais evidências de já estar se constituindo em colapso climático. Muitos cientistas acreditam que, possivelmente, já entramos no ponto de não retorno, quando a reconstituição dos recursos naturais torna-se impossível.
Neste sentido, a transição para fluidos refrigerantes de baixo Potencial de Aquecimento Global (GWP) é urgente. Os impactos ambientais e regulatórios associados aos refrigerantes tradicionais impõem mudanças. No entanto, as alternativas constituem significativos desafios com os quais a indústria da refrigeração terá que conviver.
Não custa repetir as razões pelas quais a mudança se faz necessária. Os HFCs (hidrofluorcarbonetos), desenvolvidos para interromper a destruição da camada de ozônio, possuem alto GWP, o que contribui significativamente para o efeito estufa. O setor de AVACR é responsável por cerca de 17% das emissões globais de gases de efeito estufa. Por isso, o Protocolo de Montreal, através da Emenda de Kigali, estabelece metas para a redução gradual dessas substâncias, pressionando por alternativas sustentáveis. A União Europeia, por exemplo, já restringe o uso de refrigerantes com GWP alto, como o R-404a e o R-410a, entre outros.
Fluidos de baixo GWP, como os HFOs (hidrofluoroolefinas) e refrigerantes naturais, como o R-600a (isobutano), R-744, ou CO2, o R-290 (propano) e NH3 (amônia) são os substitutos mais imediatos, por oferecer maior eficiência energética. No entanto, todos eles impõem, em maior ou menor grau, restrições quanto ao uso e manipulação, pelos riscos associados à inflamabilidade ou toxicidade, quando não em ambas.
Para falar a respeito, a revista Abrava + Climatização & Refrigeração conversou, por email, com Rogério Marson Rodrigues, gestão industrial na Eletrofrio e que também assina artigo nesta edição.
Revista Abrava+Climatização& Refrigeração: Em função da necessidade de eliminar os fluidos refrigerantes de alto GWP, algumas alternativas apresentam significativos níveis de toxicidade e inflamabilidade. Levando em conta esses dois aspectos, qual a categoria mais indicada para aplicações em sistemas de refrigeração comercial e ar-condicionado?
Rogério Marson Rodrigues: Qualquer projeto que receba um fluido refrigerante inflamável ou tóxico demanda o atendimento de normas específicas para este fim, o que torna indiferente a aplicação de uma categoria ou outra.
A+CR: O que diferencia essas três classes de fluidos refrigerantes (A2L, A2 e A3)?
RMR: As classes A2L, A2 e A3 diferenciam-se pela taxa de inflamabilidade (velocidade de propagação da chama) do fluido refrigerante, sendo descritas como lenta, moderada e rápida, respectivamente.
A+CR: Quando é recomendado a utilização de refrigerantes A2L? Quais os fluidos refrigerantes que se enquadram nesta categoria de acordo com a aplicação?
RMR: Os fluidos refrigerantes A2L são uma opção quando se busca soluções de baixo GWP com menores taxas de inflamabilidade. Parte destas opções são misturas de HFO com HFC, como o R-454C, uma alternativa já aplicada no mercado brasileiro, com GWP=148.
A+CR: Quais as particularidades dos refrigerantes A2? Quais são os refrigerantes que se enquadram nesta categorização? Quando eles podem ser utilizados?
RMR: Os fluidos refrigerantes A2 possuem uma taxa de inflamabilidade superior aos A2L, motivo pelo qual são pouco aplicados na refrigeração, como o R-152a, pois, além de terem uma inflamabilidade moderada, não possui GWP tão baixo quanto as opções dos hidrocarbonetos classe A3.
A+CR: Quais são os refrigerantes A3? Quais as principais aplicações para essa categoria de refrigerantes?
RMR: Os hidrocarbonetos são os fluidos refrigerantes classe A3 mais conhecidos, muito aplicados nos refrigeradores domésticos e expositores refrigerados do tipo self-contained (motor acoplado).
A+CR: Quais são as principais normas e diretrizes que regulamentam o uso e manipulação dos refrigerantes A2L, A2 e A3?
RMR: As normas ABNT NBR IEC 60079-10-1 – Atmosferas explosivas e ABNT NBR 16069 – Segurança em sistemas frigoríficos, são as mais recomendadas para orientação sobre projetos que receberão fluidos refrigerantes classes A2L, A2 e A3.
A+CR: O que precisa ser observado em matéria de segurança quando da instalação de sistemas com refrigerantes A2L? E quando da manutenção desses sistemas?
RMR: A maior atenção que deve ser dada na aplicação de fluidos A2L é quanto a carga instalada em relação aos ambientes nos quais os equipamentos de refrigeração estarão instalados e por onde as tubulações circularão, considerando a taxa de diluição em relação ao volume de cada ambiente considerado. A manutenção em equipamentos com fluidos A2L deve ser executada apenas por profissional habilitado e qualificado.
A+CR: Também em relação aos fluidos A3?
RMR: Os equipamentos que utilizam fluidos refrigerantes classe A3, instalados em ambientes internos com livre circulação de pessoas, como refrigeradores domésticos e expositores do tipo self-contained (motor acoplado), devem respeitar a regulamentação de possuir uma carga máxima de 150 g de fluido refrigerante por circuito de refrigeração. Já os equipamentos instalados no meio externo, em local com acesso restrito a pessoal técnico, não possuem regras que limitam a carga instalada, mas as boas práticas de projeto indicam que quanto menor a carga mais segura é a instalação. Para estas instalações, a Instrução Técnica 28 do Corpo de Bombeiros do Estado de São Paulo dá orientações importantes para a execução de um projeto seguro. A manutenção em equipamentos com fluidos A3 deve ser executada exclusivamente por profissional habilitado e qualificado.
A+CR: É possível estabelecer as vantagens e restrições de cada uma dessas classes de refrigerantes?
RMR: Quanto menor a taxa de inflamabilidade mais segura é a operação do sistema de refrigeração, porém, cada projeto deve analisar as opções em função do objetivo que se busca em termos de GWP.
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