Os equipamentos de fluxo de refrigerante variável, ou VRF, têm ganhado notoriedade a partir da virada do século. O espaço de mercado conquistado desde seu lançamento, é proporcional à polêmica instalada em torno às suas vantagens e deficiências perante os sistemas de expansão indireta. Entretanto, não se pode categorizá-los propriamente como novidades, pelo contrário, são empregados desde o início da refrigeração comercial ou do ar-condicionado, dadas suas potencialidades de adequar a capacidade de refrigeração do equipamento à carga térmica.

O consultor Oswaldo de Siqueira Bueno, diretor da Oswaldo Bueno Engenharia e Representações, amparado na sua extensa e sedimentada experiência com refrigeração e ar-condicionado explica que “estas formas de controle de capacidade, até o desenvolvimento da eletrônica no controle da rotação dos compressores, operavam de forma a reduzir a capacidade de bombeamento em volume do compressor ou em desviar uma parte do refrigerante comprimido diretamente para a sucção. Estas formas em maior ou menor grau não apresentavam um bom rendimento em cargas parciais. A introdução das novas tecnologias de controle da rotação do compressor, de controle da expansão do refrigerante e de gerenciamento de operação, permitiu estender o controle de capacidade dos grandes compressores aos menores, inclusive de capacidade fracionária com grande economia de energia operacional.” Assim, a verdadeira evolução teria sido a da eletrônica, com a automação e controle, muito bem aplicada nas unidades VRF.

Usufruindo dos benefícios da automação, os fabricantes de equipamentos souberam explorar pontos sensíveis junto ao usuário. “Tecnologia avançada com controles já incorporados, baixo nível de ruído, controle individualizado, operação quente ou frio e ótima divulgação de mercado. Permite que o incorporador entregue uma infraestrutura mínima, reduzindo o custo de investimento a sua parcela de responsabilidade pela garantia de equipamentos e instalação, e transferindo-os aos proprietários”, entende Carlos Kayano, diretor da Thermoplan Engenharia Térmica. Pesam a favor do VRF, também a facilidade de uso através de controle remoto e o menor consumo de energia pelo fato de não possuir filtros ou dutos de distribuição de ar.

Fabio Chaim, gerente de soluções de engenharia da Daikin, diz que “ainda há uma resistência por parte daqueles que preferem trabalhar com as tecnologias convencionais. Quanto maior contato as pessoas têm com as soluções e toda a tecnologia embarcada destes equipamentos, maior é a aceitação e, portanto, maior a divulgação e utilização desta solução. Há uma questão cultural que precisa ser vencida e convencida, como isto toma tempo, o crescimento do VRF no mercado tende a continuar, ainda há muita resistência e desconhecimento por parte do mercado em todos os problemas que conseguimos resolver com esta solução.”

Melhores faixas de aplicação

Chaim acredita que a utilização de VRF passa por uma mudança nos paradigmas de projetos. “A questão da modularidade que o VRF promove implica em não haver uma faixa específica de capacidade, há casos de grande capacidade que podemos utilizar o VRF, assim como há casos de pequena capacidade que esta solução não seria a ideal (e vice-versa). São muitos os fatores que devem ser analisados quando da determinação de qual o melhor sistema utilizar, sendo o principal fator entender a necessidade de cada cliente e como pretendem ocupar e utilizar os espaços condicionados.”

Kayano, por outro lado, entende que a melhor aplicação do VRF se obtém “em instalações de múltiplas zonas, independente da faixa de capacidade. Para instalações de capacidade reduzida o custo da instalação pode se tornar um fator restritivo.” O projetista e consultor aponta as instalações de conforto com necessidade de controle individual, como as mais favoráveis, desaconselhando o uso em instalações de precisão, processos industriais e controle de umidade.

“O problema é a segurança em caso de vazamento, quanto mais longas as linhas, maior a carga de fluído frigorífico. No caso do Eldorado (empreendimento da Cyrela que foi um dos primeiros de grande porte a adotar o VRF) a carga de fluído frigorífico que normalmente é de 0,7 kg/tr atingiu 2,0 kg/tr. Normalmente eu limitaria a capacidade da unidade externa em torno de 52 kW (15 tr) de capacidade de refrigeração, normalmente para escritórios com cerca de 375 m2. Sem sombra de dúvida são excelentes para instalações residenciais normalmente na faixa de 8 kW (2,25 tr) atendendo 4 ambientes a partir de uma única unidade externa. É importante assegurar o acesso à unidade externa para a manutenção”, alerta Bueno.

Para o consultor da Bueno Engenharia o sistema tem grande adequação para ambientes em que a qualidade e a distribuição do ar não é crítica, lugares onde os usuários são sempre os mesmos, como residências e escritórios, e onde um equipamento por ambiente é suficiente para o condicionamento de ar. Mas faz suas restrições ao uso em hospitais e comércio com grande concentração de pessoas. “Nestes casos, as unidades internas deveriam ser devidamente projetadas com a renovação e a filtragem de ar necessária, bem como o fácil acesso para higienização e limpeza. Existem unidades internas de tratamento de ar com as mesmas características das unidades de água gelada, para assegurar a qualidade do ar.”

Quanto à eficiência, há uma variação a depender do tamanho da unidade condensadora e a composição das unidades evaporadoras a ela acopladas. “O VRF tem boa eficiência energética em toda a sua faixa de capacidade de 8 kW (2,25 tr) a 158 kW (45 tr). Não possui filtros, pelo menos M5 ou superior, e não tem dutos para a distribuição do ar, que implicaria em maior consumo no ventilador”, explica Bueno.

O gerente de soluções de engenharia da Daikin explica que, “no passado, amplos espaços com necessidade de grande e constante volume de ar não eram o escopo ideal para o VRF (por exemplo teatros e salas de cinema), contudo, com o avanço das novas tecnologias e soluções, o VRF hoje consegue atender parcialmente também estas áreas. Áreas muito amplas (como áreas comuns em shoppings centers) ou áreas com controle rigoroso de temperatura, umidade e maior nível de filtragem continuam sendo um desafio para serem atendidos com esta solução, embora seja possível, tipicamente acaba-se adotando a solução com água gelada.”

VRF ou água gelada

Tampouco é simples estabelecer comparação de eficiência energética entre o VRF e a água gelada, devido aos diversos fatores envolvidos. “Mesmo que um sistema de água gelada disponha de um chiller extremamente eficiente, a eficiência do sistema como um todo dependerá das instalações agregadas de distribuição de ar e de água. É necessário que o projetista efetue uma avaliação criteriosa considerando todos os detalhes de cada instalação. Normalmente uma instalação de VRF perde eficiência quando requer tubulações muito longas, mas isso pode ser minimizado mediante a distribuição adequada das unidades condensadoras, o que é mais difícil tendo uma infraestrutura de água gelada centralizada. Já uma instalação de água gelada pode ser customizada para operar com eficiência em condições fora de padrões usuais, enquanto o VRF tem o seu desempenho otimizado para operar nas condições adotadas pelos fabricantes”, explica Kayano.

A isso, Bueno acrescenta a desvantagem do VRF “sempre que se exigir a mesma qualidade e distribuição do ar possível com os sistemas das unidades de tratamento do ar de expansão indireta.”

Os mesmos requisitos e recursos colocados aos sistemas de água gelada, na garantia da qualidade do ar interior, são válidos para o VRF.  “Os sistemas de fluxo de ar variável (VRF) podem ser adquiridos com uma ou mais unidades dedicadas de tratamento do ar externo em termos de renovação, filtragem, resfriamento e de desumidificação do ar externo, bem como as unidades internas deveriam ter no mínimo filtragem M5”, diz Bueno.

Indubitavelmente o VRF coloca uma quantidade maior de fluido refrigerante em circulação nos ambientes, exigindo do projetista uma seleção bem criteriosa dos equipamentos, “levando em consideração a quantidade de fluido refrigerante que circula dentro de cada sistema e o tamanho e tipo de ocupação dos ambientes atendidos, de modo a evitar que em caso de vazamento o fluido refrigerante inunde alguma sala e traga prejuízo à saúde dos ocupantes, tonando-se um fator limitante para a seleção do tamanho da unidade condensadora e a quantidade de unidades evaporadoras conectadas a ela”, alerta Kayano. Pelo mesmo motivo, o uso de tubulação muito longa deve ser avaliado com cuidado por aumentar a quantidade de fluido refrigerante dentro do sistema. (Ver box)

Ampliação de mercado

Não há dúvidas que o VRF tem ampliado seu raio de ação. Kayano dá como exemplos as aplicações com condicionador de ar central de maior capacidade e com filtros finos, instalações para tratamento de ar externo de grande porte, instalação mista de VRF com água gelada e até para aquecimento de água. Bueno, por sua vez, aponta a simplificação das instalações de pequeno porte, como residências, como mostra a NBR 16655.

A vida do instalador também fica facilitada. “As unidades chamadas de VRF, receberam uma eletrônica muito sofisticada e são capazes de auto diagnóstico informando ao técnico sobre a não conformidade que eventualmente tenha ocorrido. Por exemplo, o equipamento informa quando a carga de fluído frigorífico está correta ou não. Normalmente a eletrônica aplicada irá informar o que deve ser feito para manter o equipamento em operação correta (bom coeficiente de desempenho COP)”, explica Bueno.

Entretanto, o instalador deve ficar atento para as recomendações do fabricante e, de acordo com Kayano, atuar com esmero na instalação da tubulação, garantindo estanqueidade contra vazamento e reduzindo a quantidade de curvas e ondulações.

Condensação e qualidade do ar

O sistema deixa margem para o uso de dutos para a distribuição do ar, assim como opções de condensação. “Instalações com dutos garantem melhor distribuição de ar e reduz a sensação do jato gelado sobre o corpo das pessoas, que ocorre com bastante frequência em instalações com equipamentos montados diretamente nos ambientes, e deveria ser adotado sempre que possível”, defende Kayano.

Já a escolha pelo tipo de condensação, água ou ar, a decisão tampouco é complicada. Se a unidade externa puder ficar no mesmo piso da área condicionada com acesso ao ar externo, evitando o curto circuito ou recirculação do ar de condensação, a recomendação, em geral, é pela instalação com unidades externas a ar. Um problema de fachada ou a redução do comprimento das tubulações pode determinar que a instalação das unidades condensadoras a água sejam instaladas no piso do escritório tendo o seu resfriamento feito por torres evaporativas de circuito fechado ou Drycooler, trocador de calor sensível ar-água de circuito fechado.

“Trata-se de uma definição de projeto que deve ser avaliada mediante elaboração de um estudo comparativo que indique as vantagens e desvantagens de cada alternativa tanto no aspecto técnico como no econômico. O partido arquitetônico pode ser um fator decisivo para esta avaliação, considerando o conceito adotado para as fachadas e a altura da edificação. Em geral a aplicação com condensação a água é menos utilizada devido ao custo mais elevado da instalação associado ao custo operacional de consumo e tratamento de água. Já a aplicação do VRF com condensação a ar torna-se bastante favorável quando se disponibiliza uma área técnica adjacente aos ambientes condicionados, pois, reduz expressivamente a perda de eficiência do equipamento e a quantidade de fluido refrigerante no sistema”, recomenda Kayano.

No caso da renovação de ar, o diretor da Thermoplan explica que são poucas as opções de unidade interna que permitem a renovação de ar pelo próprio condicionador. “Nas instalações convencionais de VRF o que predomina é a utilização de ventilador independente que faz a captação do ar no exterior, filtra e distribui junto a cada condicionador, seja diretamente no ambiente ou direcionado ao retorno da unidade. Os fabricantes disponibilizam equipamentos que podem efetuar o tratamento do ar externo, que poderá ser introduzido no ambiente já resfriado e desumidificado, havendo atualmente disponibilidade de equipamentos de maior capacidade e que são aplicados com frequência nas mais diversas aplicações.”

Chaim reconhece que um controle rigoroso de temperatura, umidade e nível de filtragem ainda é um desafio de ser atingido com VRF. “Em projetos de conforto, no qual o controle fino não seja necessário, não há maiores restrições à utilização desta tecnologia, haja visto as novas unidades AHU interligadas ao VRF que permitem lidar com uma maior vazão de ar do que as evaporadoras tipicamente lidam.”

Bueno chama a atenção para o fato de a capacidade de refrigeração ser apresentada em termos de HP e não em kW, como é usual nos sistemas de água gelada. E explica a razão: “A refrigeração comercial costuma adquirir as unidades condensadoras pela potência nominal do compressor e o número mágico era 1 HP (motor do compressor) para uma capacidade de refrigeração de 1 tr da câmara frigorífica. Como a refrigeração comercial trabalha com temperaturas abaixo de 10 ºC, o consumo é maior para a mesma capacidade de refrigeração; portanto, para o ar-condicionado o valor passou a ser 0,8 HP de potência nominal do motor do compressor para 1 tr (3,526 kW) de capacidade de refrigeração. O uso de unidades externas chamadas de 56 HP não tem significado em termodinâmica, pois o motor era de 60 kW (80 HP) de potência elétrica instalada e uma capacidade de refrigeração nominal de 158 kW (210 HP ou 45 tr).”

Novas possibilidades

A vinda de novas unidades internas tem expandido o raio de atuação deste sistema, por conseguirem manipular uma maior vazão de ar e, portanto, permitindo a utilização de VRF em áreas mais abertas. A própria Daikin, segundo Chaim, desenvolveu unidades resistentes à névoa de óleo para utilização dentro de fábricas e com possibilidades de atender ambientes amplos atendendo apenas as áreas ocupadas.

Chaim alerta, entretanto, que nada substitui o projeto. “O correto selecionamento significa a utilização do produto mais eficiente para uma determinada obra; cada caso tem suas particularidades exigindo que sejam estudados e analisados individualmente. A instalação correta é parte absolutamente fundamental desta equação, não se limitando apenas à tubulação de cobre e refrigerante, mas também na questão da disposição das unidades e de toda as infraestruturas elétricas e de controle. Por fim, uma adequada instrução de operação por parte do instalador e fornecedor ao cliente final também conta muito na avaliação do sistema como um todo. Naturalmente a base é um projeto adequado, o que nos leva de volta à questão do selecionamento apropriado do equipamento.”

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Ronaldo Almeida
ronaldo@nteditorial.com.br

 

 

 

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