Introdução

A implantação pela Eletrobrás da estrutura tarifária horosazonal a partir de meados da década de 1980 ensejou corrida por mecanismo de contraposição aos efeitos que, para o ar-condicionado, teve a termoacumulação como principal fator aliado, possibilitando produzir durante a noite a energia térmica para uso na climatização durante o período de pico da tarifação horosazonal.

Não obstante, independentemente da tarifação, o processo de armazenamento térmico maximiza a eficiência energética e racionaliza a magnitude da potência utilizada, cortando picos de carga localizados e evitando o sobredimensionamento da própria instalação de refrigeração e dos sistemas elétricos de suprimento da energia primária, bem como, de sistemas hidrônicos de arrefecimento. Esta seria a visão focada daquela época até uma década atrás.

  1. Energias renováveis e mitigação de impactos

O foco atual está na adoção de providências para obtenção das edificações NZEBs (), em curso principalmente na Europa, Estados Unidos e Japão, com marcos iniciais pretendidos e concretizados até 2020, especialmente as edificações públicas, sendo sequenciadas por compromisso de estendê-las às demais novas edificações até 2030, bem como, a aplicação de retrofit em edificações existentes para torná-las NZEBs.

A ASHRAE vem publicando sistematicamente artigos que abordam, numa visão holística, as formas de contribuição do ar-condicionado para viabilizar esse objetivo, indicando a termoacumulação como componente prioritário, que se sobrepõe de forma insofismável ao armazenamento da energia elétrica que corresponderia à produção da refrigeração em tempo real. Além do mais, dispensa a transformação da energia elétrica em energia térmica na hora do uso.

  1. Armazenamento térmico ou elétrico?

Estudo de simulação realizado, e com resultado publicado na edição dezembro/2017 do ASHRAE Journal, assegura que o armazenamento de frio resultou num custo de implantação 73% inferior ao custo de armazenamento equivalente de energia elétrica em baterias, além de constituir-se ambientalmente muito mais amigável, graças à maior robustez e vida útil, e ao menor impacto ambiental dos rejeitos, comparado ao sistema de baterias.

Portanto, a visão de futuro, no meu entender, deixa de ser prioritariamente conjuntural, para constituir-se em estrategicamente estrutural, maximizando a captação e uso da energia renovável conforme a sazonalidade das fontes e procedendo o armazenamento mais adequado para compatibilização entre os perfis de produção e consumo.

O “horário de ponta” deixa de ser uma imposição econômica e passa a constituir-se em escalonamento estruturado que prioriza os processos naturais e ambientalmente amigáveis de captação e uso da energia.

  1. Potencialidade da radiação solar

O Guidebook nº 12 da REHVA informa que a quantidade de energia lançada pelo Sol no topo da atmosfera terrestre, a 10 km de altitude, equivale em 45 minutos ao total de todas as formas de energia consumidas no planeta durante 1 ano.

Cabe proceder, da forma correta, a captação e o uso. Além da variabilidade das fontes, o desafio para as edificações NZEBs são os edifícios altos, edifícios com uso intensivo de energia, exemplificadamente os Datas Centers e edifícios com sites sombreados.

  1. Parcimônia no uso

Elaboramos o projeto de um Home Center concebido para poder vir a constituir-se em um NZEB.Trata-se de sistema por expansão indireta e condensação a ar, dotado de termoacumulação a água, armazenamento térmico realizado concomitantemente com o atendimento à carga, dotado de processos naturais de climatização, quais sejam: ciclo economizador, resfriamento evaporativo, recuperadores de energia de ventilação e edificação termicamente ativa, alimentado por sistema de geração elétrica fotovoltaica.

A carga térmica de pico é 1.125 kW (320 TR) na estação de alta entalpia do ar externo, enquanto a potência de geração de frio totaliza 1.477 kW (420 TR), procedendo o armazenamento de frio durante o dia para a operação no período passivo da fonte energética.

O volume do tanque de termoacumulação é 515 m³, enquanto a vazão do sistema primário é 122,4 m³/h e do secundário, 81,3 m³/h, ocorrendo o carregamento do tanque no horário matinal antes da abertura da loja e durante o período ativo da loja, utilizando a sobra da vazão entre os fluxos primário e secundário.

O sistema opera com temperatura da água a 6°C e diferencial de temperatura 12°C obtido em 2 estágios, para as condições de máxima entalpia do ar externo, variando para valores mais altos conforme a estação climática (frio/seco ou quente/seco).

  1. Arranjo estratégico

Os chillers adotados no processo de acumulação térmica são os mesmos que se utilizariam nos processos triviais com temperaturas 7,0°C e 12,5°C, sendo que resultam em majoração das potências efetivas, em melhor eficiência termodinâmica (não eficiência mecânica, elétrica ou aerodinâmica) e dispensam, ainda, uma bomba primária de circulação de água e componentes correlatos, hidrônicos e elétricos.

Em relação às unidades de tratamento de ar pode resultar em majoração da profundidade das serpentinas, passando de 4 filas para 6 filas, mas nos sistemas ar-água mantêm-se as serpentinas e completa-se o resfriamento por processo radiante, utilizando água à 14°C oriunda do estágio anterior de resfriamento de ar nas serpentinas. As unidades DOAS, em processos com cargas desacopladas, resultam com três serpentinas, duas delas de resfriamento e desumidificação profunda, e uma terceira de reaquecimento em ciclo run around entre o ar tratado a ser insuflado e a água gelada de retorno. Tudo isso com uma redução do consumo energético de 30% ou maior.

A majoração da eficiência energética deve-se creditar ao processo, não aos equipamentos. São processos que empregam altas temperaturas de resfriamento e baixas temperaturas de aquecimento.

  1. Reflexões

 A Newsletter 04/2014 do HPBmagazine@ashrae.org, no artigo Energy Efficiency Market report afirma que a maior fonte de energia para o mundo entre 1974 e 2010 foi através de eficiência energética, contabilizando em 2010 63 EJ (exajoules) de uso evitado de energia, superior ao suprimento ocorrido de petróleo (oil), responsável por 43 EJ e eletricidade ou gás natural (22 EJ), cada.

Já o Manual The Little Green Data Book, editado pelo Banco Mundial, informa que 86,6% dos gases de efeito estufa gerados nos países signatários do protocolo de Kyoto são decorrentes da produção ou uso de energia, envolvendo aquecimento e resfriamento de edifícios, geração de potência e transporte.

Não há forma mais eficaz de contribuição para mitigar as causas do aquecimento global: parcimônia no uso da energia e recorrência às fontes não emitentes.

  1. Visão empresarial e responsabilidade ambiental

O empreendedor, detentor de uma rede de lojas Home Center, é autoprodutor de energia e associado à CCE (Câmara de Comercialização de Energia), usufruindo da flexibilização mercadológica que propicia a oportunidade de transferir excessos de sites energeticamente superavitários para complemento de sites energeticamente deficitários, com produção de energia 100% renovável. Esta é a visão do empreendedor consciente, comprometido com a sustentabilidade. Cabe à boa engenharia proporcionar-lhe a oportunidade da escolha.

Francisco Dantas, engenheiro mecânico, consultor e projetista na Interplan Planejamento Térmico Integrado

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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