A tecnologia aplicada ao segmento de refrigeração comercial e industrial está passando por verdadeira revolução nos últimos anos. Compressores, trocadores de calor, bombas, elementos de expansão e componentes de refrigeração estão cada vez mais sofisticados. Existem várias opções de fluidos refrigerantes, naturais e sintéticos. Os sistemas de gerenciamento e controle eletrônicos vieram para ficar e aperfeiçoar as operações.
Essa evolução tecnológica tem contribuído para que os sistemas de refrigeração operem com maior confiabilidade, segurança, estabilidade e, claro, trazendo a melhor eficiência energética possível.
Quando pensamos na performance de um sistema (melhor COP), precisamos estudar e elaborar o projeto adotando o melhor regime de operação possível vinculado ao fluido refrigerante e aos tipos de equipamentos disponíveis no mercado.Isso tudo talvez não seja nenhuma novidade, pois atualmente o termo “eficiência energética” se tornou uma espécie de mantra. Afinal, todos querem um menor consumo de energia, utilizando os equipamentos e fluidos refrigerantes que oferecem melhor COP possível, entre outras questões.
A intenção aqui, no entanto, não é trazer o óbvio, mas provocar uma reflexão que talvez passe desapercebida no dia a dia dos profissionais de refrigeração: o cálculo da carga térmica das câmaras frigoríficas. É aqui onde tudo começa!
Apesar de ser algo básico, não podemos subestimar essa importante parte do processo. Afinal, é justamente a partir do cálculo da carga que vamos dimensionar todo o sistema de refrigeração.
Quando cometemos erros no cálculo da carga térmica, a seleção dos equipamentos e componentes é diretamente comprometida. Um exemplo: em uma situação que se calcula a carga térmica com muita folga, que é o mais comum acontecer, tudo vai ficar superdimensionado: compressores e condensadores com excesso de folga, os evaporadores dentro das câmaras vão ficar grandes. O mesmo acontece para os componentes de refrigeração, elementos de expansão e a tubulação de interligação do sistema. Idem para os quadros elétricos, cabos elétricos e QGBT. Tudo isso acaba custando muito mais caro.
Além da folga no cálculo de carga térmica, também temos a tradicional folga dada no dimensionamento dos equipamentos. Nesta situação, em sistemas de refrigeração com controle de capacidade contínuo, os compressores vão operar conforme a demanda térmica real e frequentemente operam com capacidade reduzida, pois a carga térmica na grande maioria do tempo é bem menor que a máxima calculada.
É muito comum, também, a operação de um compressor com capacidade reduzida e mais um ou até mesmo dois compressores ficarem desligados por um período de inatividade.Quando o sistema de refrigeração é simples e sem controle de capacidade no(s) compressor(es), a situação fica mais delicada, pois o equipamento superdimensionado opera no “liga-desliga” diariamente, o que reduz a sua vida útil, aumenta o consumo de energia e traz uma maior ocorrência de avarias.
Sendo assim, calcular a carga térmica da forma mais precisa possível é essencial para que não só o sistema e os equipamentos sejam corretamente dimensionados, como também a operação funcione plenamente e haja uma redução do valor do investimento.
No mercado, existem poucos softwares para cálculo de carga térmica disponíveis. Entretanto, não sabemos quais são os dados, fórmulas, fatores e coeficientes utilizados nesses programas. Não temos as recomendações e o domínio total sobre o cálculo efetuado. Se utilizarmos softwares distintos inserindo os mesmos dados para o cálculo da carga térmica os resultados sempre são diferentes. Então qual valor calculado escolher? Outro aspecto é que nem todos os técnicos e engenheiros têm acesso aos softwares disponíveis.
Desta forma, o mais indicado é efetuar os cálculos com base no capítulo 24 do ASHRAE Handbook, Refrigerated Facility Loads. A ashrae (American Society of Heating, Refrigerating and Air-Conditioning Engineers) é uma associação internacional de profissionais de AVACR (Aquecimento, Ventilação, Ar-condicionado e Refrigeração) e referência na área. A organização desenvolve normas, publica artigos, promove cursos e eventos, e oferece certificações para profissionais da área.
O capítulo 24 citado apresenta todas as equações, recomendações, dados e procedimentos adequados para os cálculos das parcelas da carga térmica de uma câmara fria que são:
- Carga de transmissão, que é o calor transferido para o espaço refrigerado através de sua superfície;
- Carga de produto, que é o calor gerado por produtos trazidos e mantidos no espaço refrigerado;
- Carga interna, que é o calor produzido por fontes internas, como, por exemplo, iluminação, motores elétricos, resistências, equipamentos e pessoas que trabalham no espaço refrigerado;
- Carga de ar de infiltração, que é o ganho de calor associado ao ar que entra no espaço refrigerado;
- Além disto, esse capítulo oferece também as recomendações de determinação da carga relacionada ao equipamento de refrigeração, ou seja, o calor gerado pelos moto-ventiladores dos evaporadores dentro do ambiente da câmara fria.
Não há dúvidas que saber efetuar os cálculos utilizando o passo a passo do capítulo 24 proporcionará mais segurança e precisão no resultado, oferecendo a possibilidade de seleção de equipamentos de forma mais adequada, sem os exageros das folgas e o consequente aumento de custo.
O usuário de refrigeração, que vai construir uma câmara fria ou várias câmaras em diversas faixas de temperatura, necessita de um técnico ou engenheiro responsável que possa calcular a carga térmica no início do projeto, ou contratar um consultor para isso. Todos devem estar cientes que esse é o começo de todo o projeto de refrigeração e, em função deste número, será determinado o investimento da obra, respeitando-se é claro as diversas soluções possíveis oferecidas pelo mercado para o sistema.
Lucas Riga, engenheiro formado Faculdade de Engenharia Industrial (FEI), atua na área de refrigeração e ar-condicionado desde 1986
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